sexta-feira, 22 de maio de 2009

Versos para as insubmissas filhas de Lilith


Por André Dib

literatura // Livro de Cida Pedrosa é inspirado na personagem bíblica e é composto de poemas sensuais e eróticos



Nas últimas décadas, o mito de Lilith tem servido de inspiração tanto para artistas quanto para militantes da causa feminista. Insubmissa e rebelde, esta personagem bíblica perdeu o status de primeira mulher, feita por Deus com o mesmo barro de Adão, para amargar por séculos o papel de demônio. Identidade que tem sido contestada por mulheres na busca de emancipação e por artistas que evocam a sensualidade e erotismo de Lilith em suas obras. De forma particular, estas duas dimensões estão presentes em As filhas de Lilith, novo livro de poesias de Cida Pedrosa.

Publicação conta com obras da artista plástica Tereza Costa Rego e projeto gráfico de Jaíne Cintra, designer da equipe de arte do Diario Foto: Tereza Costa Rego/Divulgação
Em conversa com o Diario, a escritora revela que buscou em Lilith o antídoto para a síndrome de culpa que recai nos ombros femininos desde que Eva foi acusada como responsável pelo paraíso perdido. "Acho que nós, mulheres, carregamos essa culpa, e isso é uma crueldade sem fim". Os dois anos de "gestação" renderam 26 poemas com figuras femininas, uma para cada letra do alfabeto. De Angélica a Zenaide, há espaço para pessoas e cenas comuns ao cotidiano, vertidas para o suporte poético de forma ousada e perspicaz, e descritas pela criadora como "mulheres pós-tudo, e histórias do que fizeram de nós".

A falta de pudor de alguns poemas beira o pornográfico, pois abre mão da metáfora para descrever atos e situações sexuais. Porém, como explica Cida, a obra não se restringe ao erotismo: também trata de lutas, dor e morte. No "verbete" Sihem, ela recria a saga real de uma mulher-bomba, que veste burca e, ao contrário do que prevê o profeta, quando chegar ao paraíso, não terá 40 virgens à espera. Outro dois personagens não-fictícios serviram aos propósitos da escritora: Joanita, uma das mães da Praça de Maio, e Khady, menina senegalesa que teve o clitóris mutilado.

A estrutura do poema narrativo, aquele que conta uma história, encontra explicação na origem da autora, nascida na área rural de Bodocó, sertão do Araripe. "A gente não tinha televisão, e meu pai, Francisco de Assis, era um grande contador de histórias. Outro era o marceneiro Zé Pedro. As histórias deles eram mais do que cinema".

As filhas de Lilith chama atenção não somente pelo conteúdo, mas pelo produto em si. Desde quando submeteu o livro ao edital do Funcultura, ela tinha em mente convidar a artista plástica Tereza Costa Rego, que disponibilizou 29 obras para o projeto. O feliz "casamento" entre texto e imagem é mérito do projeto gráfico de Jaíne Cintra, designer da equipe de arte do Diario. "O livro deixou de ser meu. É de nós três", diz Cida.

Com o lançamento, Cida comemora 30 anos de carreira, e o início de uma nova fase. Entre a advocacia (na qual atuou na área de direitos humanos) e a vida literária, iniciada com o Movimento dos Escritores Independentes, de 1982 para cá, publicou quatro livros: Restos do fim, O cavaleiro da epifania, Cântaro e Gume. Todos sob a marca da independênciareconhecível nas palavras "edição do autor". Desta vez, seu trabalho traz na capa o selo da Editora Caliban, sinônimo de tratamento gráfico diferenciado e distribuição de abrangência nacional.

"Este livro é um ritual de passagem", reflete Cida, que a partir de agora se dedicará ao universo da prosa, a começar por um livro de contos. Isso após terminar a agenda de lançamentos, que inclui as cidades de Garanhuns (16/06), Bodocó (23/06), Petrolina (25/06) e Paraty (RJ), onde participa da OFF Flip


http://www.diariodepernambuco.com.br/2009/05/20/viver1_0.asp

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