domingo, 21 de junho de 2009

Edgar Allan Poe

Edgar Allan Poe nasceu no seio de uma família escocesa-irlandesa, filho do ator David Poe Jr., que abandonou a família em 1810, e da atriz Elizabeth Arnold Hopkins Poe, que morreu de tuberculose em 1811. Depois da morte da mãe, Poe foi acolhido por Francis Allan e o seu marido John Allan, um mercador de tabaco bem sucedido de Richmond, que nunca o adotou legalmente, mas lhe deu o seu sobrenome (muitas vezes erroneamente escrito "Allen"). Depois de frequentar a escola de Misses Duborg em Londres, e a Manor School em Stoke Newington, Poe regressou com a família Allan a Richmond em 1820, e registrou-se na Universidade da Virgínia, em 1826, que viria a frequentar durante um ano apenas. Desta viria a ser expulso graças ao seu estilo aventureiro e boêmio.

Na sequência de desentendimentos com o seu padrasto, relacionados com as dívidas de jogo, Poe alistou-se nas forças armadas, sob o nome Edgar A. Perry, em 1827. Nesse mesmo ano, Poe publicou o seu primeiro livro, Tamerlane and Other Poems. Depois de dois anos de serviço militar, acabaria por ser dispensado. Em 1829, a sua madrasta faleceu, ele publicou o seu segundo livro, Al Aaraf, e reconciliou-se com o seu padrasto, que o auxiliou a entrar na Academia Militar de West Point. Em virtude da sua, supostamente propositada, desobediência a ordens, ele acabou por ser expulso desta academia, em 1831, fato pelo qual o seu padrasto o repudiou até a sua morte, em 1834.

Poe mudou-se, em seguida, para Baltimore, para a casa da sua tia viúva, Maria Clemm, e da sua filha, Virgínia Clemm. Durante esta época, Poe usou a escrita de ficção como meio de subsistência e, no final de 1835, tornou-se editor do jornal Sothern Literary Messenger em Richmond, tendo trabalhado nesta posição até 1837. Neste intervalo de tempo, Poe acabaria por casar, em segredo, com a sua prima Virgínia, de treze anos, em 1836.

Em 1837, Poe mudou-se para Nova Iorque, onde passaria quinze meses aparentemente improdutivos, antes de se mudar para Filadélfia, e pouco depois publicar The Narrative of Arthur Gordon Pym. No verão de 1839, tornou-se editor assistente da Burton's Gentleman's Magazine, onde publicou um grande número de artigos, histórias e críticas. Nesse mesmo ano, foi publicada, em dois volumes, a sua colecção Tales of the Grotesque and Arabesque (traduzido para o francês por Baudelaire como "Histoires Extraordinaires" e para o português como Histórias Extraordinárias), que, apesar do insucesso financeiro, é apontada como um marco da literatura norte-americana.

Durante este período, Virgínia Clemm soube sofrer de tuberculose, que a tornaria inválida e acabaria por levá-la à morte. A doença da mulher acabou por levar Poe ao consumo excessivo de álcool e, algum tempo depois, este deixou a Burton's Gentleman's Magazine para procurar um novo emprego. Regressou a Nova Iorque, onde trabalhou brevemente no Evening Mirror, antes de se tornar editor do Brodway Journal. No início de 1845, foi publicado, no jornal Evening Mirror, o seu popular poema The Raven (em português "O Corvo").

Em 1846, o Brodway Journal faliu, e Poe mudou-se para uma casa no Bronx, hoje conhecida como Poe Cottage e aberta ao público, onde Virgínia morreu no ano seguinte. Cada vez mais instável, após a morte da mulher, Poe tentou cortejar a poeta Sarah Helen Whitman. No entanto, o seu noivado com ela acabaria por falhar, alegadamente em virtude do comportamento errático e alcoólico de Poe, mas bastante provavelmente também devido à intromissão da mãe de Miss Whiteman. Nesta época, segundo ele mesmo relatou, Poe tentou o suicídio por sobredosagem de láudano, e acabou por regressar a Richmond, onde retomou a relação com uma paixão de infância, Sarah Elmira Royster, então já viúva.

Diferentemente da maioria dos autores de contos de terror, Poe usa uma espécie de terror psicológico em suas obras, seus personagens oscilam entre a lucidez e a loucura, quase sempre cometendo atos infames ou sofrendo de alguma doença. Seus contos são sempre narrados na primeira pessoa.

Morte

No dia 3 de Outubro de 1849, Poe foi encontrado nas ruas de Baltimore, com roupas que não eram as suas, em estado de delirium tremens, e levado para o Washington College Hospital, onde veio a morrer apenas quatro dias depois. Poe nunca conseguiu estabelecer um discurso suficientemente coerente, de modo a explicar como tinha chegado à situação na qual foi encontrado. As suas últimas palavras teriam sido, de acordo com determinadas fontes, «It's all over now: write Eddy is no more», em português, «Está tudo acabado: escrevam Eddy já não existe».

Nunca foram apuradas as causas precisas da morte de Poe, sendo bastante comum, apesar de incomprovada, a ideia de a causa do seu estado ter sido embriaguez. Por outro lado, muitas outras teorias têm sido propostas ao longo dos anos, de entre as quais: diabetes, sífilis, raiva, e doenças cerebrais raras.


Estilo literário e temas
Gêneros

As obras mais conhecidas de Poe são Góticas, um gênero que ele seguiu para satisfazer o gosto do público. Seus temas mais recorrentes lidam com questões da morte, incluindo sinais físicos dela, os efeitos da decomposição, interesses por tapocrifação, a reanimação dos mortos e o luto. Muitas das suas obras são geralmente consideradas partes do gênero do romantismo negro, uma reação literária ao transcendentalismo, o qual Poe fortemente não gostava.

Além do horror, Poe também escreveu sátiras, contos de humor e hoaxes. Para efeito cômico, ele usou a ironia e a extravagância do rídiculo, muitas vezes na tentativa de liberar o leitor da conformidade cultural. De fato, "Metzengerstein", a primeira história que Poe publicou, e sua primeira incursão em terror, foi originalmente concebida como uma paródia satirizando o gênero popular. Poe também reinventou a ficção científica, respondendo na sua escrita às tecnologias emergentes como balões de ar quente em "The Balloon-Hoax".

Poe escreveu muito de seu trabalho usando temas especificamente oferecidos para os gostos do mercado em massa. Para esse fim, sua ficção incluiu muitas vezes elementos da popular pseudociência, como frenologia e fisiognomia.

Teoria literária

A escrita de Poe reflete suas teorias literárias, que ele apresentou em sua crítica e também em peças literárias como "The Poetic Principle". Ele não gostava de didaticismo e alegoria, pois acreditava que os significados na literatura deveriam ser uma subcorrente sob a superfície. Trabalhos com significados óbvios, ele escreveu, deixam de ser arte. Ele acreditava que o trabalho de qualidade deveria ser breve e concentrar-se em um efeito específico e único. Para isso, ele acreditava que o escritor deveria calcular cuidadosamente todos sentimentos e idéias. Em "The Philosophy of Composition", uma peça na qual Poe descreve seu método de escrita em "The Raven", ele afirma ter seguido estritamente este método. Porém, foi questionado se ele realmente seguiu esse sistema. T. S. Eliot disse: "É difícil para nós lermos esta peça sem pensar se Poe escreveu seu poema com tanto cálculo, ele poderia ter pego um pouco mais de dores sobre isto: o resultado dificilmente tem crédito ao método". O biógrafo Joseph Wood Krutch descreveu a peça como "um exercício um tanto engenhoso na arte de racionalização".


Obras

O Wikisource possui trabalhos escritos por este autor: Edgar Allan Poe. O Wikiquote tem uma coleção de citações de ou sobre: Edgar Allan Poe.

A Dream Within a Dream (1827)
Dreams (1827)
Tamerlane (1827)
Al Aaraaf (1829)
Alone (1830)
To Helen (1831)
Israfel (1831)
The City in the Sea (1831)
To One in Paradise (1834)
The Conqueror Worm (1837)
The Narrative of Arthur Gordon Pym (1838)
Silence (1840)
A Descent Into the Maelstrom (1841)
Tell Tale Heart (1843)
Lenore (1843)
The Black Cat (1843)
Dreamland (1844)
The Purloined Letter (1844)
The Divine Right of Kings (1845)
The Raven (1845)
Ulalume (1847)
Eureka (1848)
Annabel Lee (1849)
The Bells (1849)
Eldorado (1849)
Eulalie (1850)
The pit and the pendulum (1842)
William Wilson (1839)


Fonte:http://pt.wikipedia.org/wiki/Edgar_Allan_Poe

sábado, 20 de junho de 2009

Oscar Wilde


Escritor, poeta e teatrólogo irlandês - 1856-1900


Oscar Fingall O'Flahertie Wills Wilde é o nome completo daquele que viria a ser um dos maiores escritores do século XIX. As turbulências e confusões cercam sua vida desde o dia do seu nascimento; uma dúvida até os dias de hoje. A data mais defendida seria 16 de outubro de 1854, mas, existem algumas divergências, sendo que alguns estudiosos afirmam que a data correta seria 15 de outubro de 1856; outros apontam o ano de 1855. Isso se torna irrelevante diante da grandiosidade de sua obra, desenvolvida durante os seus 46 anos de vida.

Esse irlandês, nascido em Dublin, era filho de um médico, Sir William Wilde, morto em 1876 e uma escritora, Jane Francesca Elgee, árdua defensora do movimento da Independência Irlandesa, fazendo com que desde criança Oscar Wilde estivesse sempre rodeado pelos maiores intelectuais da época.

Criado no Protestantismo, Oscar Wilde foi um aluno brilhante, sobretudo nos estudos das grandes obras clássicas gregas e pelos seus altos conhecimentos dos idiomas. Estudante na Portora Royal School de Enniskillem, onde ingressou em 1865, ganhou vários prêmios por esse seu destaque, inclusive no Trinity College, em Dublin, e no Magdalen College, Oxford, onde ingressou em 1874, saindo 4 anos depois. Nessa mesmo época, em 1878, ganhou o prêmio Newdigate, com a clássico "Ravena".

Desde cedo, sobressaía-se entre os demais estudantes, tanto pela sua inteligência quanto pelo temperamento forte e anticonvencional, levando-se em consideração a alta moralização dos costumes no século XIX. Mantinha sempre um ar de superioridade por onde ia, mas, sua forte personalidade e seu brilho natural sobrepunham-se a isso, tornando-o figura indispensável.

Em 1882, foi convidado para ir aos Eatados Unidos e palestrar sobre o seu recém criado Movimento Estético, onde se tornou o principal divulgador das idéias de renovação moral. Defendia o 'belo' como única solução contra tudo o que considerava denegrir a sociedade da época. Esse Movimento, que contava também com toda a nova geração de intelectuais britânicos, visava transformar o tradicionalismo na época Vitoriana, dando um tom de vanguarda ás artes.

No ano seguinte, 1883, vai para Paris, explorando todo o mundo literário francês, o que acaba por enfraquecer seu Movimento. Nesse período, no qual conquistou vários títulos, começou a publicar suas obras, pequenos escritos com inspiração clássica.

Em seguida, retorna para a Inglaterra, onde casa-se com Constance Lloyd, filha de uma advogado de renome em Dublin. Muda-se para Chelsea, notoriamente um bairro de artistas, com grande influência cultural. Teve 2 filhos, Cyril em 1885, e Vyvyan no ano seguinte.

Mesmo após ao casamento, manteve-se muito conhecido e requisitado em todas as rodas literárias, honrado com todos os compromissos aos quais era convidado. Tornou-se realmente uma pessoa indispensável e comentada aos eventos sociais, espalhando glamour e comentários por onde passava. Possuía uma aparência elegante, que atraia os olhares: vestia-se elegante e extravagantemente bem, com roupas e adereços que, segundo suas próprias palavras, sempre refletiam o que de mais íntimo existia dentro de si.

Continuando com suas obras, a seguinte foi "Vera", um texto teatral bem sucedido, publicado em 1880. Após esta, publicou uma coletânea de poemas. Chegou a ter 3 peças em cartaz simultaneamente nos teatros ingleses, fato notável tanto na época, como nos dias de hoje.

Em 1887 e 1888, foram lançados vários contos e novelas, como "O Príncipe Feliz", "O Fantasma de Canterville" e várias outras histórias, todas fantasiosas demais, chegando a ser comparadas com Contos de Fadas, mas, como toda a amargura que residia no coração de Oscar Wilde.

Durante toda sua vida, rumores iam sendo criados em torno da suposta vida irregular que ele teria, o que dava à sua figura, um ar de encantamento e atração ainda maior. Podia-se dizer que era amado por uns, repudiado por outros. Alguns estudiosos consideram que essa má fama chegou a atrapalhar sua carreira literária, mas, seus admiradores provam que era justamente o contrário, Oscar Wilde tinha a mistura perfeita de petulância e doçura.

Seu período literário mais produtivo foi 1887-1895.

Em 1891, lançou o que viria a ser sua obra prima, a obra que o colocaria para sempre no hall dos grandes escritores, "O Retrato de Dorian Gray". Livro que retrata a decadência moral humana, "O Retrato..." fez o escritor tornar-se ainda mais admirado e famoso.

No entanto, no seu apogeu literário, começaram a surgir os problemas pessoais. O que antes eram apenas boatos, passou a se concretizar, dando início á decadência pessoal daquele grande homem.

Suas atitudes, já um tanto quanto audaciosas para a época, ainda desafiariam muito mais a moralidade aristocrática inglesa. Rumores sobre seu homossexualismo, severamente condenado por lei na Inglaterra, apareceram, não podendo mais serem negados por ele.

Conhece o Lord Alfred Douglas (ou Bosie, como era apelidado), pivô de todo seu drama amoroso. O pai de Lord Douglas, Marquês de Queensberry, sabendo do envolvimento do filho com o escritor, envia carta á Oscar Wilde no Albermale Club, onde o ofende e recrimina toda e qualquer relação que ele venha a ter com o jovem Lord, dizendo "A Oscar Wilde, conhecido Sodomita". O escritor decidi processar o Marquês por difamação.

Em seguida, tenta mudar de idéia e desistir do processo, visto que muitas rumores pairavam sobre sua própria conduta. Mas, é tarde demais, e as provas concretas da sua desregrada vida sexual começam a aparecer e um novo processo é instaurado contra ele. Entre as provas, a mais contundente é uma carta enviada por Wilde para o jovem Lord, peça chave no julgamento.

A 6 de abril começa o primeiro dos processos contra ele., no Tribunal de Old Bailey.

Em 11 de abril, é transferido da Prisão de Bow Street, onde estava encarcerado, para a de Holloway, como réu de crime inafiançável.

Em 1885, a sentença é decretada: Oscar Wilde foi condenado por sua relação dúbia com o Lord e suas práticas homossexuais à 2 anos de cárcere.

Depois desse incidente, toda sua fama e sucesso financeiro começa a desmoronar. Suas obras e livros são recolhidos das livrarias, assim como suas comédias tiradas de cartaz. O que lhe resta, acaba sendo leiloado para suas despesas do processo judicial.

Mesmo condenado, Wilde não abaixaria sua cabeça e declararia á todos que quisessem ouvir, o que se passava dentro de si:

"O amor que não ousa dizer o nome ' nesse século é a grande afeição de um homem mais velho por um homem mais jovem como aquela que houve entre Davi e Jonatas, é aquele amor que Platão tornou a base de sua filosofia, é o amor que você pode achar nos sonetos de Michelangelo e Shakespeare. É aquela afeição profunda, espiritual que é tão pura quanto perfeita. Ele dita e preenche grandes obras de arte como as de Shakespeare e Michelangelo, e aquelas minhas duas cartas, tal como são. Esse amor é mal entendido nesse século, tão mal entendido que pode ser descrito como o `Amor que não ousa dizer o nome' e por causa disso estou onde estou agora. Ele é bonito, é bom, é a mais nobre forma de afeição. Não há nada que não seja natural nele. Ele é intelectual e repetidamente existe entre um homem mais velho e um homem mais novo, quando o mais velho tem o intelecto e o mais jovem tem toda a alegria, a esperança e o brilho da vida à sua frente. Que as coisas deveriam ser assim o mundo não entende. O mundo zomba desse amor e às vezes expõe alguém ao ridículo por causa dele."
(Essas foram as palavras do literato em seu primeiro julgamento, em 26 de abril de 1895.)

Ainda assim, a poesia estava em suas veias e escreve mais duas obras: "A Balada do Cárcere de Reading", baseado na execução do ex-sargento Charles T. Woolridge dentro da Prisão de Reading e "De Profundis", uma longa carta ao Lord Douglas.

Wilde era o prisioneiro C-33 do presídio de Reading. E, enquanto estava preso, mais especificamente no ano de 1896, aconteceu um fato curioso: naquela madrugada de 3 de fevereiro, ele diz ter uma visão. Era o espírito de sua mãe que aparecia para ele. "Eu a convidei para sentar, mas ela só balançou a cabeça", disse o escritor. No dia seguinte, ele recebe a notícia da morte de sua mãe.

Foi libertado em 19 de maio de 1897 e transferiu-se para a França, onde adotou o pseudônimo de Sebastian Melmouth, usando esse nome inclusive para o seu registro no Hotel d´Alsace, onde passou a maior parte do resto dos seus dias. Mesmo após sua libertação, continua a manter contato com Lord Douglas, mas, sua relação já não era mais tão íntima. E, mesmo antes do julgamento, haviam dúvidas sobre o tamanho da intimidade entre os dois.

Após toda essa decadência, mais física, econômica do que moral, conhece a pobreza, e tudo o que de pior ela pode trazer. Vive isolado em hotéis baratos, destruindo-se através do absinto, cuja cor lhe rendeu frases célebres.

Não mais veria seus filhos, que chegaram a ter a atitude absurda de trocar de nomes, visto à vergonha que seu pai teria "impingido" ás suas vidas. Sua ex-mulher morreria em 1899.

Oscar Wilde, espirituoso e brilhante escritor, morreu de meningite e uma infecção no ouvido chamada "cholesteotoma" (doença muito comum antes do advento dos antibióticos) em um quarto barato de um hotel de Paris, ás 9 hrs 50 mins do dia 30 de novembro de 1900. Morreu sozinho, mas, não desmoralizado, pois havia deixado insubstituível obra que, mesmo depois de 1 século, ainda é admirada e relembrada, tamanho á sua genialidade. Suas últimas palavras foram "Esse papel de parede é horrível! Alguém precisa trocá-lo!", referindo-se ao papel de parede do quarto de hotel onde se encontrava.

O dramaturgo jaz no cemitério Père Lachaise, o mais célebre de Paris, onde estão os túmulos de outras 105 grandes personalidades do mundo, como Balzac, Chopin, Alan Kardec, La Fontaine e Molière. Seu túmulo fica no número 83 da Avenue Carette, entre a Transversal 3 e a Avenue Circulaire. Porém, esse não é o lugar onde ele foi inicialmente enterrado. Em 1900, ele foi sepultado no pequeno cemitério de Bagneux. As únicas pessoas que compareceram ao seu enterro foram seu amigo Robert Boss, que certa vez fez divulgação de alguns manuscritos de Wilde e Lord Douglas.

Lord Douglas, ironicamente, arca com todas as despesas do funeral do escritor e depois disso, casa-se, porém, não foi feliz em sua nova união, separando-se mais tarde. Sua vida pregressa com Oscar Wilde o impede de ter a custódia dos filhos. Ele acaba seus dias ainda rememorando a lembrança do escritor; recordações que deixa evidente em seu livro de memórias, escrito em 1938, Without Apology (Sem Desculpas), onde faz um balanço de toda a sua vida.

(Éditions Ferni, Géneve - Otto Pierre, Editores - Rio de Janeiro)

CITAÇÕES

"Certas criaturas têm a mania de dar bons conselhos precisando tanto deles para si... É o que chamo de cúmulo da generosidade."

" Nenhum homem é rico o bastante para comprar seu passado."

"O egoísmo não consiste em vivermos conforme os nossos desejos, mas sim em exigirmos que os outros vivam da forma que nós gostaríamos. O altruísmo consiste em deixarmos todo o mundo viver do jeito que bem quiser."

"A felicidade de um homem casado depende das mulheres com as quais não se casou."

"O maior castigo que o destino aplica ao homem casado é ver que sua mulher sempre acaba por se parecer com sua sogra."

"Para entendermos os outros, precisamos fortalecer a nossa própria personalidade."

"A única coisa de que podemos ter certeza acerca da natureza humana é que ela muda."

'Um homem que não tem pensamentos individuais é um homem que não pensa."

"A vida não é regida pela vontade ou pela determinação. A vida é um conjunto de nervos, fibras e células que se formam lentamente, onde se esconde o pensamento e a paixão sonha os seus sonhos."

"Um primeiro contato que começa com um elogio transformar-se-á certamente em real amizade. Assim, ela nasce da forma mais bonita."

" Em uma palavra, a Vida é o melhor, ou antes, o único discípulo da arte."

"Desconfiem de mulher que confessa a sua verdadeira idade. Uma mulher que diz isto, poderá dizer qualquer coisa."

"A alma nasce velha e se torna jovem. Eis a comédia da vida. O corpo nasce jovem e se torna velho. Eis a tragédia da alma."

"Não pode haver amizade entre homem e mulher. Pode haver paixão, hostilidade, adoração, amor, mas não amizade."

"Sempre podemos reconhecer pelo olhar se um homem tem ou não encargos domésticos que lhe pesam. Já reparei numa expressão de profunda tristeza nos olhos de inúmeros homens casados."

"É tão fácil converter os outros. É tão difícil converter a nós mesmos."

"Uma idéia que não é perigosa não merece ser chamada de idéia."

"Quando o homem chega a idade de fazer o mal, deveria também ter bastante idade para fazer o bem."

"A única coisa necessária é o supérfluo."

"Quando somos ditosos, sempre somos bons; porem quando somos bons, nem sempre somos ditosos."

"A caridade cria uma multidão de pecados ."

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Tesouro brasileiro na internet

Fábio de Castro escreve para a “Agência Fapesp”

Lançado oficialmente com acesso on-line a cerca de 3 mil documentos, o projeto Brasiliana Digital deverá disponibilizar integralmente o acervo de 40 mil volumes raros doados por José Mindlin à USP

Foi lançado oficialmente, na última terça-feira (16/6), o projeto Brasiliana Digital, que disponibilizará pela internet, com acesso livre, a coleção de cerca de 40 mil volumes da Biblioteca Guita e José Mindlin, doada à Universidade de São Paulo (USP) em 2006, além de outros acervos da USP.

A versão inicial, que já está funcionando, oferece acesso a 3 mil documentos da coleção reunida por Mindlin ao longo de mais de 80 anos. O lançamento do projeto, realizado em conjunto com uma homenagem ao bibliófilo, ocorreu durante a cerimônia de abertura do seminário Livros, Leituras e Novas Tecnologias, no Museu de Arte de São Paulo (Masp), na capital paulista.

“Desde que comecei a coleção, já sabia que a biblioteca não podia ser para sempre um patrimônio particular. Estava claro que éramos depositários e formadores desse conjunto, mas sem o viés da propriedade. Como toda minha família tem forte relação com a USP desde a década de 1930, quando entrei no curso de Direito da universidade recém-inaugurada, não tive dúvidas sobre a escolha da instituição para a qual deveria doar esse patrimônio”, disse Mindlin.

A fase piloto de implantação do projeto conta com apoio da Fapesp, por meio da modalidade Auxílio a Pesquisa – Regular. Os recursos fornecidos pela Fundação permitiram a compra de um sistema integrado de digitalização robotizada de livros encadernados.

“O robô foi adquirido em janeiro e neste primeiro semestre parte da nossa equipe foi para os Estados Unidos receber treinamento para operá-lo. Há sete semanas estamos trabalhando com ele. O robô permite digitalizar cerca de 2,4 mil páginas por hora, o que equivale a cerca de 40 livros por dia”, disse Pedro Puntoni, professor do Departamento de História da USP e coordenador da Brasiliana Digital.

A Biblioteca Guita e José Mindlin reúne diversos tipos de livros, folhetos e manuscritos sobre assuntos brasileiros. “O acervo cobre áreas como literatura, prosa e poesia, história, relatos de viagens, crítica literária, ensaios, filologia, dicionários, obras de cronistas, história natural, botânica e zoologia. Nem tudo está em português, mas tudo diz respeito ao Brasil”, explicou Puntoni.

Segundo ele, o projeto permitirá aliar a conservação das obras – muitas delas com vários séculos de existência – e a universalização do acesso a elas. “O governo brasileiro, em suas três esferas, tem investido muito em inclusão digital, que deverá aumentar imensamente a parcela da população brasileira com acesso à internet. A Brasiliana Digital dará acesso a esse acervo riquíssimo, preservando-o ao mesmo tempo”, afirmou.

O historiador explicou que ainda não há previsão do tempo necessário para a digitalização integral do acervo doado por Mindlin. Mas, com a tecnologia de digitalização avançada e um sistema de gestão de informação adequado, a equipe está pronta para ampliar o ritmo do projeto.

“Como o prédio no qual o acervo será instalado ainda não está pronto, não pudemos ainda definir a dinâmica do processo. O robô, apelidado pela equipe de Maria Bonita, é operado por conservadores. Quando lidamos com um livro do século 16, por exemplo, temos que diminuir o ritmo. Estamos ainda aprendendo a lidar com o equipamento”, disse.

O projeto recebeu da Fapesp até o momento cerca de US$ 980 mil, usados para a compra do robô e apoio a 15 bolsistas. Segundo Puntoni, a equipe envolvida com o projeto tem cerca de 30 integrantes, entre pesquisadores, bibliotecários, analistas e programadores.

A base do projeto Brasiliana Digital, segundo Puntoni, é o projeto Brasiliana USP, coordenado por István Jancsó, do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP. “A Brasiliana USP é um projeto da reitoria da USP que permitirá o acesso para pesquisa e ensino da maior coleção de livros e documentos de e sobre o Brasil custodiada por uma universidade em escala mundial, tornando-a disponível na internet”, explicou Puntoni.

Para abrigar o acervo doado por Mindlin e a nova sede do IEB, a Brasiliana USP está construindo um edifício com cerca de 20 mil metros quadrados no centro da Cidade Universitária, em São Paulo. O projeto foi desenvolvido pelos arquitetos Eduardo de Almeida e Rodrigo Mindlin Loeb, com a assessoria da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP.

“O contrato com a construtora prevê o prédio pronto no fim de outubro, incluindo toda a parte estrutural, como ar-condicionado, cadeiras do auditório, elevadores, etc. A partir daí será preciso trabalhar na instalação de equipamentos, sistemas de segurança e no acabamento. Acreditamos que em 2010 o novo prédio estará operacional”, disse Puntoni.

A parte do prédio onde ficará o IEB, no entanto, deverá levar aproximadamente mais dois anos para ser finalizada. “A parte da construção voltada à coleção Mindlin foi privilegiada, para podermos trazer logo o acervo. Precisaremos ainda levantar recursos para a finalização da outra parte”, disse.

Integração digital

Segundo Jancsó, a concepção básica do projeto Brasiliana USP parte da ideia de criar uma estrutura de conservação de uma parcela do patrimônio cultural da nação, que é a Biblioteca Guita e José Mindlin.

“A partir daí, poderemos investir na conservação do extraordinário acervo documental guardado pela USP. A universidade tem, em suas bibliotecas, cerca de 6,5 milhões de livros. Tudo isso hoje está à disposição dos interessados quase que exclusivamente mediante acesso presencial”, disse.

A ideia do projeto, segundo Jancsó, é contribuir para a conservação de todo o acervo da USP por meio da constituição de um centro de formação de restauradores que levará o nome de Guita Mindlin – a esposa de José Mindlin, morta em 2006 aos 89 anos, pioneira nas ações de restauro de livros e documentos no Brasil.

“Por outro lado, é papel da universidade pública fazer com que a visão patrimonial seja superada e fazer com que esse acervo custodiado pela USP possa estar ao alcance, de modo universal e irrestrito, a todos os brasileiros interessados”, afirmou.

De acordo com Jancsó, os acervos do IEB e da Biblioteca Guita e José Mindlin são complementares e, juntos, deverão formar a principal coleção existente de livros e documentos voltados aos estudos brasileiros. “A construção desse prédio no centro da USP resgata a ideia de que essa universidade foi criada para pensar o Brasil”, disse.

Jancsó conta que a USP investiu R$ 15 milhões para a construção do novo prédio e o projeto captou mais R$ 18 milhões junto a fundações e recursos provenientes de mecanismos de renúncia fiscal. Já os recursos da Brasiliana Digital foram integralmente fornecidos pela Fapesp. “Agora, conseguimos autorização para captar mais R$ 11 milhoes pela lei Rouanet, para finalizar a obra. E vamos ter que buscar mais recursos. A obra é do tamanho do projeto”, destacou.

O site Brasiliana USP reúne informações sobre o projeto, sobre a Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin e Brasiliana Digital, com destaques como o primeiro livro impresso no Brasil (A Relação da Entrada[...], por Antonio Isidoro da Fonseca), cenas da vida urbana de Jean-Baptiste Debret (1768-1848) e o relato do marinheiro Hans Staden (1525-1579), de 1557.

“A edição de 1557 de Marpurg é a verdadeira primeira edição da obra de Hans Staden. Comprei-a encadernada com mais três livros (Varthema, Federman e um romance de cavalaria alemão), numa encadernação de 1558. A biblioteca possui também uma edição pirata de Frankfurt, provavelmente do mesmo ano, que, não dispondo das matrizes da primeira edição, foi ilustrada com gravuras da viagem de Varthema ao Oriente, sem qualquer relação com o Brasil e com os índios”, disse Mindlin.

Brasiliana Digital: http://www.brasiliana.usp.br/bbd
(Agência Fapesp)

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Sonetos de William Shakespeare completam 400 anos

1609-2009 — Sonetos de Shakespeare completam 400 anos


Os Sonetos de Shakespeare (The Sonnets) constituem uma coleção de 154 poemas sob a forma estrófica do soneto inglês que abordam uma galeria de temas tais como o amor, a beleza, a política e a morte.


Foram escritos, provavelmente, ao longo de vários anos, para no final, serem publicados, exceto os dois primeiros, em uma coleção de 1609; os número 138 ("When my love swears that she is made of truth") e 144 ("Two loves have I, of comfort and despair") haviam sido previamente publicados em uma coletânea de 1599 intitulada The Passionate Pilgrim.

Os Sonetos foram publicados em condições que, todavia hoje seguem sendo incertas. Por exemplo, existe uma misteriosa dedicatória no começo do texto onde um certo "Mr. W.H." é descrito pelo editor Thomas Thorpe como "the only begetter" (o único inspirador) dos poemas; se desconhece quem era essa pessoa. A dedicatória se refere também ao poeta com a igualmente misteriosa frase "ever-living", literalmente imortal, mas normalmente aplicado a uma pessoa já morta. Mesmo que os poemas tenham sido escritos por William Shakespeare, não se sabe se o editor usou um manuscrito autorizado por ele ou uma cópia não autorizada. Estranhamente, o nome do autor está dividido por um hífen na capa e no começo de cada página da edição. Estas controvérsias têm incentivado o debate sobre a autoria das obras atribuídas a Shakespeare.

Os primeiros 17 sonetos se dirigem a um jovem, incentivando-o a casar-se e a ter filhos, de forma que sua beleza possa ser transmitida às gerações seguintes. Este grupo de poemas é conhecido com o nome de procreation sonnets (sonetos da procriação).

Os sonetos que vão do 18 ao 126 também são dirigidos a um jovem, porém agora ressaltando o amor que é descrito com muito lirismo.

Os compreendidos entre o127 e o152 abordam temas como a infidelidade, a resolução para controlar a luxúria, etc.

Os últimos dois sonetos, o 153 e o 154, são alegóricos.

Estrutura

Cada soneto é formado por quatro estrofes, três quartetos e um terceto final, compostos em pentâmeros iâmbicos (o verso também usado nas obras dramáticas de Shakespeare) com um esquema de rima abab cdcd efef gg (forma que hoje em dia é conhecida como soneto shakespereano). Há três exceções: os sonetos 99, 126 e 145. O número 99 tem quinze versos. O 126 consiste em seis tercetos e dois versos brancos (sem rimas) escritos em letras itálicas. Por outro lado, o 145 está em tetrâmetros iâmbicos, e não em pentâmeros. Com freqüência, o começo do terceiro quarteto assinala a volta do verso no que o tom do poema muda, e o poeta expressa uma revelação ou aparição.

Personagens

Três são os personagens aos que se dirigem a maioria dos sonetos: um formoso jovem, um poeta rival e a dama morena; convencionalmente, cada um destes destinatários é conhecido pelo sobrenome de, respectivamente, o Fair Youth, o Rival Poet e a Dark Lady. A linguagem lírica expressa admiração pela beleza do jovem, e que mais tarde mantém uma relação com a Dark Lady. Desconhece-se se os poemas e seus personagens são fictícios ou autobiográficos. Se fossem autobiográficos, as identidades dos personagens estariam abertas ao debate. Diversos especialistas, especialmente A. L. Rowse, têm sugerido identificar os personagens com figuras históricas.

Fair Youth

O “Fair Youth” é um jovem sem nome a quem se dirigem os sonetos que vão do 1 ao 126. O poeta descreve o jovem com uma linguagem romântica e carinhosa, um fato que tem levado vários comentaristas a sugerir uma relação homossexual entre os dois, considerando que outros interpretam como um amor platônico.

Os primeiro poemas da coleção não sugerem uma relação pessoal estreita; pelo contrário, neles se recomendam os benefícios do matrimônio e de ter filhos. Com o famoso soneto 18 ("Shall I compare thee to a summer's day": Deveria comparar-te a um dia de verão), o tom muda dramaticamente para uma intimidade romântica. O soneto 20 se lamenta explicitamente de que o jovem não seja uma mulher. A maioria dos seguintes sonetos descreve os altos e baixos de um relacionamento, culminando com um caso, digamos assim, entre o poeta e a Dark Lady. O relacionamento parece terminar quando o Fair Youth sucumbe aos encantos da dama.

Tem havido numerosas tentativas de se identificar o amigo misterioso. O protetor de Shakespeare durante algum tempo, Henry Wriothesley, terceiro conde de Southampton, é o candidato que mais vezes tem sido sugerido para essa identificação, ainda que o último protetor de Shakespeare, William Herbert, terceiro conde de Pembroke, foi recentemente cogitado como outra possibilidade. Ambas as teorias estão relacionadas com a dedicatória dos sonetos a 'Mr. W.H.', "the only begetter of these ensuing sonnets" (o único inspirador dos seguintes sonetos): as iniciais podiam ser aplicadas a qualquer dos condes. Sem dúvida, já que a linguagem de Shakespeare parece em certas ocasiões indicar que o amigo seja alguém de um status social mais elevado que o deles, poderia não ser assim. As aparentes referências à inferioridade do poeta podem ser simplesmente partes da retórica da submissão romântica. Uma teoria alternativa, exposta no relato de Oscar Wilde "The Portrait of Mr. W. H." aponta a uma série de jogos de palavras que poderiam sugerir que os sonetos foram escritos para um jovem ator chamado William Hughes (Mr. W. H.); sem dúvida, o conto de Wilde reconhece que não há evidências da existência de tal pessoa. Samuel Butler, por sua vez, acreditava que o amigo fosse um marinheiro, e recentemente Joseph Pequigney ('Such Is My love') sugeriu ser um desconhecido plebeu.

The Dark Lady

Os sonetos do 127 ao 152 se dirigem a uma mulher geralmente conhecida como a “Dark Lady”, pois de seus cabelos dizem que são pretos e de sua pele que é morena. Estes sonetos têm um caráter explicitamente sexual, diferentemente dos escritos ao "Fair Youth". Da leitura se percebe que o jovem dos sonetos e a dama mantiveram uma relação apaixonada, mas que ela lhe foi infiel, possivelmente com o "Fair Youth".

Humildemente, o poeta se descreve como calvo e de meia idade no momento da relação.

Muito se tem imaginado em numerosas ocasiões identificar a "Dark Lady" com personalidades históricas, tais como Mary Fitton ou a poeta Emilia Lanier, que é a favorita de Rowse. Alguns leitores têm sugerido que a referência a sua pele escura poderia sugerir uma origem espanhola ou mesmo africana (por exemplo, na novela de Anthony Burgess sobre Shakespeare, Nothing Like the Sun). Outras pessoas, pelo contrário, insistem em afirmar que a Dark Lady não é mais do que um personagem de ficção e que nunca existiu na vida real; sugerem, afinal, que a tonalidade da pele da dama não deve ser entendida literalmente senão como representação do desejo pecaminoso da luxúria como oposta ao amor platônico ideal associado com o "Fair Youth".

The Rival Poet

O poeta rival é, às vezes, identificado com Christopher Marlowe ou com George Chapman. Sem dúvida, não há evidências contundentes de que o personagem tenha uma correspondência com alguma pessoa real.

Temas

Os sonetos de Shakespeare são, freqüentemente, mais sexuais e prosaicos que as coleções de sonetos contemporâneas de outros poetas. Uma interpretação disto é que os sonetos de Shakespeare são, em parte, uma imitação ou uma paródia da tradição de sonetos amorosos petrarquistas que dominou parte da poesia européia durante três séculos. O que Shakespeare faz é converter a "madonna angelicata" em um jovem ou a formosa dama em uma dama morena. Shakespeare viola também algumas regras sonetísticas que haviam sido estritamente seguidas por outros poetas: fala de males humanos que não tem nada a ver com o amor (soneto 66), comenta assuntos políticos (soneto 124), faz gracejos sobre o amor (soneto 128), parodia a beleza (soneto 130), joga com os papéis sexuais (soneto 20), fala abertamente sobre sexo (soneto 129) e inclusive introduz engenhosos matizes pornográficos (soneto 151).

Legado

Além de situar-se ao final da tradição sonetística petrarquista, os sonetos de Shakespeare podem também ser vistos como um protótipo, ou inclusive como o começo, de um novo tipo de moderna poesia amorosa. Após Shakespeare ser descoberto durante o século XVIII — e não só na Inglaterra — os sonetos cresceram em importância durante o século XIX.

A importância e influência dos sonetos se demonstram na inumerável série de traduções que se tem feito deles. Até hoje, só nos países de língua germânica, já foram feitas centenas de traduções completas desde 1784. Não há nenhuma língua importante que não tenham sido traduzidos, incluindo o Latim, Turco, Japonês, Esperanto, etc.; e até em alguns dialetos.


Soneto 130

Não tem olhos solares, meu amor;
Mais rubro que seus lábios é o coral;
Se neve é branca, é escura a sua cor;
E a cabeleira ao arame é igual.

Vermelha e branca é a rosa adamascada
Mas tal rosa sua face não iguala;
E há fragrância bem mais delicada
Do que a do ar que minha amante exala.

Muito gosto de ouvi-la, mesmo quando
Na música há melhor diapasão;
Nunca vi uma deusa deslizando,

Mas minha amada caminha no chão.
Mas juro que esse amor me é mais caro
Que qualquer outra à qual eu a comparo.



Fonte: http://www.starnews2001.com.br/sonnets.html


quarta-feira, 17 de junho de 2009

Quem foi o verdadeiro Conde Drácula?



Imagem/Getty Images
Pintura de Vlad (Drácula) Tepes, príncipe do século 15 que inspirou o vampiro fictício de Bram Stoker



Foi somente quando avaliou referências durante uma pesquisa no British Museum que o romancista Bram Stoker encontrou o homem que serviria de base perfeita para seu clássico personagem de terror gótico, o Conde Drácula [fonte: Kent State University]. Vlad Tepes, um príncipe do século 15, que vivia nas montanhas da Europa oriental foi sua inspiração.

Relatos da crueldade de Vlad Tepes vêm sendo distorcidos ao longo da história e a adaptação de Stoker parece ter perpetuado esses equívocos. Do pai, Vlad orgulhosamente herdou o nome "Dracul" ("Filho do Dragão"), mas o príncipe passou a ser chamado de "Tepes" ("Empalador") baseado em seu suposto gosto de empalar suas vítimas.

Mas Stoker não se inspirou apenas no nome do príncipe. O reinado de Tepes realmente foi cruel e sangrento. Quando se investiga o sensacionalismo da história, é fácil encontrar relatos extremamente exagerados que obscurecem os fatos, como os de milhares de pessoas torturadas, mutiladas ou mortas por ele ou sob seu comando [fonte: University of Louisiana].

Vlad fez muitos inimigos poderosos como príncipe da Wallachia, região da Romênia, porque era defensor do cristianismo contra os turcos muçulmanos. Foram seus inimigos que divulgaram histórias terríveis sobre ele, o que inadvertidamente assegurou o lugar de Tepes na história. Os relatos dos feitos e das atrocidades cometidas por Tepes eram tão impressionantes que um desagradável poema épico sobre ele foi publicado pela máquina de impressão de Gutenberg apenas oito anos depois de o mesmo equipamento ter sido usado para imprimir a primeira Bíblia [fonte: Mundorf and Mundorf]. Se os detratores não tivessem se empenhado em uma campanha contra ele através de publicações que existem até hoje, o legado de Tepes poderia ter se perdido.
Então quem foi esse homem? Tepes tinha sede de sangue na vida real como o personagem de ficção nos filmes e livros? A resposta é sim - talvez até mais.

O empalador

A ficção criada por Bram Stoker quanto ao Vlad Tepes estimulou uma pesquisa que visava mostrar os motivos para os assassinatos cometidos pelo príncipe. Tepes desejava uma Romênia unificada, livre das influências externas da Alemanha (em inglês), da Hungria (em inglês) e dos turcos.

A consolidação de seu poder foi cruel. Na Páscoa de 1456, Tepes convidou a aristocracia da região para jantar com ele. Depois da refeição, ele matou os idosos e os mais fracos e marchou 50 milhas junto aos demais convidados a um castelo dilapidado, do qual se apossou. Ali fez a nobreza trabalhar pesado para restaurar o castelo. A maioria morreu vítima de maus tratos e de exaustão; os que sobreviveram foram empalados vivos em estacas fora do castelo onde as restaurações haviam sido concluídas [fonte: Carroll].

O pai de Vlad, Vlad Dracul, governou Wallachia de 1436 a 1442, foi destituído por seus compatriotas e retomou o trono de 1443 a 1446. Vlad Tepes ocupou a mesma posição de 1456 a 1462 [fonte: Tacitus]. Quando se iniciou na Ordem do Dragão, organização secreta dos cavaleiros cristãos, ele assumiu o nome "Drácula" que seria substituído pelo apelido "Tepes" por quem o temia e o odiava.

As ideologias sociais de Vlad Dracul eram contraditórias. Vlad queria ser lembrado como um santo e chegou a matar um monge católico que negou que ele seria canonizado [fonte: Carroll]. Seu comportamento jamais poderia ser comparado ao de um santo. Vendo a destituição como um castigo a seu domínio, Tepes convidou seus pobres súditos para jantar com ele. No fim do jantar, ele trancou a porta da sala e seus guardas atearam fogo no local, matando os que estavam dentro do recinto [fonte: Marinari].

Seus inimigos estrangeiros sofreram punições semelhantes (senão piores) a de seus súditos. Durante quatro anos, Tepes e seu irmão mais novo foram aprisionados pelos turcos quando o pai os havia enviado como tributo do sultão Mehmet. Para os turcos, o pai de Tepes tinha se tornado um líder fantoche da Wallachia e seus filhos foram aprisionados para garantir a contínua lealdade do pai deles [fonte: Fasulo]. Esperava-se que Tepes agisse como seu pai, mas, em vez de manter a submissão aos turcos, ele resolveu combatê-los.

Quando se tornou príncipe em 1456, Tepes deu passos largos em direção à independência da Romênia. Ele promoveu uma guerra biológica ao enviar súditos disfarçados de turcos com doenças infecciosas para viver entre os militares nos campos [fonte: Marinari]. Quando eles invadiram a capital de Wallachia, Tirgoviste, os turcos que sobreviveram encontraram uma floresta (com dimensão entre 800 metros a 3 quilômetros) feita inteiramente de corpos de prisioneiros capturados e empalados em estacas. Os invasores partiram rapidamente [fonte: Carroll].

A empalação, método de execução muito usado por Tepes, era uma forma extremamente dolorosa de morrer. Tepes se certificava de causar o máximo de dor quando empalava suas vítimas ao arredondar as extremidades das estacas para reduzir o corte. Estacas eram inseridas no ânus da vítima e empurradas para a outra extremidade até sair pela boca. Depois disso, as vítimas empaladas eram içadas verticalmente e deixadas em agonia - algumas vezes dias a fio [fonte: Fasulo].

O velho vampiro no romance de Stoker precisava de sangue para continuar vivo; Tepes derramou sangue para dar vida longa a seus objetivos. Segundo algumas estimativas, o número de vítimas chegou a 40 mil [fonte: University of Louisiana]. Vale destacar que alimento e morte eram muito entrelaçados na vida de Tepes. Ele freqüentemente jantava com seus convidados antes de matá-los e ficou conhecido por fazer refeições ao ar livre no meio de pessoas mortas ou agonizantes [fonte: Martin]

Por que sangue é um símbolo de vitalidade e poder na ficção?

Sangue: símbolo da vida

A maioria dos cristãos não iria pressupor o vampirismo na história da última ceia. Cristo oferece aos discípulos o cálice contendo vinho que simboliza seu sangue. Mas existe um paralelo entre a Eucaristia e as lendas de vampiro: ambas sugerem que o sangue traz a vida.

De acordo com algumas fontes, sangue também era conhecido por sua capacidade mítica de manter a beleza. Quando o Drácula da ficção de Bram Stoker se alimentava de sangue, sua aparência mudava e ele se tornava bonito e jovem. Comenta-se que a condessa húngara Elizabeth Bathory usava sangue de suas vítimas para promover a beleza de sua pele. Algumas mulheres da época renascentista acreditavam que aplicar sangue de pombos na pele pudesse manter a beleza [fonte: McNally].

Antropofagia (canibalismo) é um exemplo da simbólica vitalidade proveniente da ingestão de carne ou de sangue de outros humanos. Por meio do canibalismo, a vitalidade geralmente surge de duas fontes: da família e dos derrotados. Endocanibalismo se refere à ingestão de carne de um membro do grupo. Em algumas culturas, comer carne de parentes serve para manter a linha dos ancestrais [fonte: Goldman]. Exocanibalismo consiste na ingestão de carne de uma pessoa de fora do grupo, a exemplo de um inimigo capturado. Segundo relatos, Tepes cometeu exocanibalismo quando ingeriu sangue de turcos capturados, embora não haja evidências de que ele acreditasse obter qualquer poder decorrente do ato. Antes, ele havia comido pão embebido em sangue em uma tigela como sinal do que os turcos deveriam esperar do futuro [fonte: West Grey Times].

Canibalismo associado à loucura no mundo moderno e desenvolvido. O alemão Armin Meiwes foi condenado por carnificina ao matar e comer um humano, que foi condescendente com o ato.Talvez o caso mais famoso de canibalismo tenha acontecido em 1972, quando um avião que levava a seleção uruguaia de rugbi caiu na Cordilheira dos Andes. Diversas pessoas sobreviveram e recorreram ao canibalismo comendo a carne dos colegas mortos para sobreviver por mais de dois meses [fonte: Walton (em inglês)].

Parece que nossos ancestrais levaram algum tempo para criar costumes - restrições culturais - contra o canibalismo. Evidências de antropofagia recente (1100 d.C.) foram descobertas em povoados em Anasazi no sudoeste dos Estados Unidos [fonte: Melmer]. Pesquisadores encontraram uma variação no gene humano em todo o mundo o que sugere que nós descendemos dos canibais [fonte: BBC (em inglês)].

Assim, lendas de vampiros podem ser alegorias de verdadeiros monstros na vida real - talvez como Vlad Tepes - que se recusaram a honrar o sagrado tabu de não consumir a vitalidade de outros humanos.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Confúcio - Biografia




Introdução sobre Confúcio


Ele pode ser considerado um pioneiro no estilo “autoajuda”. Só que seus chavões bem intencionados, anedotas enigmáticas e aforismos exóticos podem tê-lo feito um dos homens mais influentes da história. Confúcio foi um sábio chinês que esperava que seus discípulos tornassem-se bons funcionários públicos. Na China imperial seus ensinamentos vigoraram durante dois mil anos como regras de conduta e como alimento espiritual. E quem saísse da linha terminava, no mínimo, castrado.

O predomínio da filosofia de Confúcio só terminou com a revolução comunista de 1949. Até então ser chinês era ser confucionista. Mas o comunismo não o erradicou completamente. O confucionismo continua a sobreviver no modo de vida na China vermelha, na dissidente Taiwan e nos bairros chineses espalhados pelo mundo. Apesar do confucionismo ser tão conhecido, sabe-se muito pouco a respeito do seu criador.



Isto é Confúcio


Não suspeite de fraude e tapeação e ao mesmo tempo nunca deixe de estar alerta contra elas. Isso é necessário para quem deseja chegar ao topo.

Algumas pessoas podem ser persuadidas a fazer coisas que não são capazes de compreender.

É difícil encontrar um homem que queira estudar por três anos sem pensar em um emprego no final.


Mesmo com toda essa influência, Confúcio teria morrido frustrado, acreditando que não teria sido bem-sucedido em sua missão. Sem querer contrariar um homem tão sábio, podemos afirmar que o confucionismo é uma filosofia essencialmente prática que ainda exerce grande influência sob a forma de um neoconfucionismo. Seus temas principais são a ética e a política. Diferente do que ocorreu na filosofia ocidental, o confucionismo pouco especulou sobre o sentido da existência e o significado da vida. Nele, a metafísica praticamente não existe. Conheça na próxima página um pouco da vida e da obra de Confúcio.


Confúcio e a arte da ética e da política

Na China, ele era conhecido como "o mestre Kung", ou melhor, Kung-fu-tsé. Confúcio é a versão em latim de seu nome. O filósofo nasceu em 551 a.C., no estado feudal de Lu (atualmente região que faz parte da província de Chantung). Ele viveu no século 6 a.C., época em que a filosofia ocidental estava sendo inventada na Grécia por Tales de Mileto, em que Buda nasceu e em que o taoísmo estava surgindo. Seu pai era um militar (que tinha 70 anos de idade quando o filho nasceu) e tinha parentesco com os governantes da dinastia Chang. © iStockphoto.com / Gautier Willaume

Aos 18 anos de idade, Confúcio já estava casado. Pobre, ele tinha diversos empregos, como cocheiro e tratador de animais. Dedicava-se a estudar em seu tempo livre. Entre as áreas de seu interesse estavam a história, a música e a liturgia. Sua ambição era obter um emprego público, mas, sem sucesso nas suas tentativas, acabou virando professor. Só que para isso fundou sua própria escola, com o objetivo de ensinar administradores políticos a governar.

Naquela época, a China vivia tempos de miséria e guerra entre seus estados feudais. Os horrores vivenciados por Confúcio influenciaram profundamente seu modo de pensar o mundo. Ele entendeu que aquele sofrimento todo teria que acabar e a sociedade deveria passar a funcionar em benefício de todos os seus membros. Segundo ele, o administrador deve cumprir com suas obrigações que nem um bom pai cuida de seu filho.

À semelhança das escolas gregas dos tempos de Sócrates, Platão e Aristóteles, Confúcio ensinava em sessões informais de conversas baseadas em perguntas e respostas. Seu carisma e estilo cativante atraíram alunos de diferentes províncias chinesas, entre eles, nobres a pobretões. Basicamente, um professor de moral, ele ensinou sobre como as pessoas deviam se comportar. E esse ensinamento vinha normalmente na forma de homilias, como “o homem superior é comedido em palavras mas não em realizações” ou “ quem não corrige seus erros torna-se ainda mais errado”.

A filosofia de Confúcio assumiu caráter religioso, apesar de não ser sua intenção. Enquanto ele tentava popularizar seus ensinamentos, outro filósofo chinês, o lendário Lao-tsé, criava o taoísmo, que acabou funcionando como uma espécie de complemento ao confucionismo. Os dois filósofos chegaram a se encontrar e o velho sábio Lao-tsé condenou o orgulho e a ambição de Confúcio.

Muitos dos alunos de Confúcio tornaram-se excelentes administradores e tanto governantes como governados perceberam que o governo poderia realmente trabalhar em benefício de todos. Um desses alunos, o príncipe regente Yanh Hou, ao assumir o poder, nomeou Confúcio como Ministro do Crime. Nesse improvável cargo, os relatos mostram o filósofo como um bem-sucedido administrador. Mas, apesar de não existir um ladrão nas terras em que Confúcio lutava contra o crime, havia exageros como a condenação à morte das pessoas que inventassem roupas fora do comum. Esses excessos confucianos levaram à promoção de Confúcio a um cargo de mais prestígio, salários extraordinários, mas sem nenhum poder. E sem poder decidir, Confúcio renunciou. Já com mais de 50 anos de idade, decidiu peregrinar pela China em busca de um governo que o deixasse pôr em prática suas ideias administrativas.

Em sua década como andarilho, Confúcio não foi bem-sucedido em conseguir algum emprego público. Os discípulos do filósofo, que viviam em sua terra natal, o convenceram a retornar para casa. Assim ele fez e viveu melancolicamente, com um imenso sentimento de frustração, seus últimos cinco anos lendo, escrevendo e editando comentários sobre os clássicos chineses. Em 479 a.C., aos 72 anos de idade, Confúcio morreu. Suas últimas palavras teriam sido: “A grande montanha deverá esfarelar-se, a viga forte se romper, o homem sábio deverá secar como uma planta”.




Como ser um bom administrador


"Chuansun Chih perguntou ao mestre:
- O que devo fazer para me tornar um homem superior e ser funcionário do governo?
- Deve respeitar as cinco qualidades mais elevadas e repelir as quatro nocivas.
- Quais são essas cinco qualidades elevadas?
- O homem superior é gentil sem aceitar subornos. Ele trabalha ao lado do povo sem dar motivos para ressentimentos. Ele tem ambições mas não é avarento. Ele tem dignidade mas sem o orgulho indevido. Ele inspira respeito mas não é cruel.
- Em que exatamente podem ser aplicadas essas qualidades?
- Trabalhar para o bem-estar do povo não é ser generoso sem aceitar suborno? Se você desse o trabalho certo para a pessoa certa, alguém ficaria ressentido? Se um homem, através do desejo de preencher sua existência, alcança tudo aquilo de que é capaz, como poderá ele ser ganancioso? O homem superior sempre cumpre suas tarefas independente de sua dificuldade ou tamanho e assim nunca é indolente. Isto certamente é dignidade sem orgulho. O homem superior cuida de sua aparência. Ele usa suas roupas e chapéu de maneira apropriada e trata os outros com respeito. E graças à sua conduta sóbria, as pessoas têm grande consideração por ele. Nesse aspecto, ele inspira respeito sem ser cruel.
- E quais são as quatro nocivas?
- Condenar um homem à morte porque ele falhou em sua tarefa sem ter recebido instruções corretas. Isso é crueldade. Esperar que um homem faça alguma coisa sem ser devidamente avisado. Isso é um desmando. Insistir que um homem se apresse para terminar seu trabalho quando recebeu instruções para realizá-lo meticulosamente. Isso é danoso. Prometer uma recompensa e depois concedê-la de má vontade. Isso é mesquinharia.
"


Este artigo é um resumo do livro “Confúcio em 90 minutos”, de Paul Strathern, da coleção “Filósofos em 90 minutos”, publicado pela Jorge Zahar Editor em 1998.

Vinicius de Moraes

Diplomata, Poeta, Cantor, Boêmio e bon-vivant, Marcus Vinícius de Melo Moraes foi o nosso poetinha. Foi parceiro como poeta-letrista de importantes nomes da música popular brasileira, mais precisamente, na bossa-nova, com Tom Jobim, Baden Powell, Toquinho, dentre outros.


Após o curso secundário, no colégio Santo Inácio, época em que já compõe versos, ingressa na Faculdade Nacional de Direito (1930). Defende tese sobre a vinda de d. João VI para o Brasil para ingressar no "Centro Acadêmico de Estudos Jurídicos e Sociais" (CAJU). Em 1933, forma-se em Direito e termina o Curso de Oficial de Reserva. Estimulado por Otávio de Faria, publica seu primeiro livro, O caminho para a distância, na Schimidt Editora.

Abandono da Advocacia, Europa e Jornalismo

Abandona a advocacia e passa a exercer as funções de censor cinematográfico até 1938, quando parte para a Inglaterra em bolsa de estudos. Trabalha na BBC de Londres e em 1939 regressa para o Brasil, onde divide São Paulo e Rio de Janeiro, quando começa a colaborar com a imprensa. Em 1935 publica Forma e exegese, com o qual ganha o prêmio Felipe de Oliveira. Em 1936, publica, em separata, o poema Ariana, a mulher. Substitui Prudente de Morais Neto, como representante do Ministério da Educação junto à Censura Cinematográfica. Conhece Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade, dos quais se torna amigo.

Novos Poemas, Bolsa de Estudos, Casamentos e Personalidades

Em 1938 publica novos poemas e é agraciado com a primeira bolsa do Conselho Britânico para estudar língua e literatura inglesas na Universidade de Oxford (Magdalen College), para onde parte em agosto do mesmo ano. Funciona como assistente do programa brasileiro da BBC. Conhece, em casa de Augusto Frederico Schimidt, o poeta e músico Jayme Ovalle, de quem se torna um dos maiores amigos. Em 1939 casa-se por procuração com Beatriz Azevedo de Mello. Regressa da Inglaterra em fins do mesmo ano, devido à eclosão da II Grande Guerra. Em Lisboa encontra seu amigo Oswald de Andrade com quem viaja para o Brasil. Em 1940 nasce sua primeira filha, Susana. Passa longa temporada em São Paulo, onde se liga de amizade com Mário de Andrade. Em 1941 começa a fazer jornalismo em A Manhã, como crítico cinematográfico e a colaborar no Suplemento Literário ao lado de Rineiro Couto, Manuel Bandeira, Cecília Meireles e Afonso Arinos de Melo Franco, sob a orientação de Múcio Leão e Cassiano Ricardo. Em 1942 inicia seu debate sobre cinema mudo e cinema sonoro, a favor do primeiro, com Ribeiro Couto, e em seguida com a maioria dos escritores brasileiros mais em voga, e do qual participam Orson Welles e madame Falconetti. Nasce seu filho Pedro. A convite do então prefeito Juscelino Kubitschek, chefia uma caravana de escritores brasileiros a Belo Horizonte, onde se liga de amizade com Otto Lara Rezende, Fernando Sabino, Hélio Pelegrino e Paulo Mendes Campos. Inicia, com seus amigos Rubem Braga e Moacyr Werneck de Castro, a roda literária do Café Vermelhinho, à qual se misturam a maioria dos jovens arquitetos e artistas plásticos da época, como Oscar Niemeyer, Carlos Leão, Afonso Reidy, Jorge Moreira, José Reis, Alfredo Ceschiatti, Santa Rosa, Pancetti, Augusto Rodrigues, Djanira, Bruno Giorgi. Freqüenta, nessa época, as domingueiras em casa de Aníbal Machado. Conhece e se torna amigo da escritora Argentina Maria Rosa Oliver, através da qual conhece Gabriela Mistral. Faz uma extensa viagem ao Nordeste do Brasil acompanhando o escritor americano Waldo Frank, a qual muda radicalmente sua visão política, tornando-se um antifacista convicto. Na estada em Recife, conhece o poeta João Cabral de Melo Neto, de quem se tornaria, depois, grande amigo.

Amizades, Carreira Diplomática e Novo Casamento

Em 1943 publica suas Cinco elegias, em edição mandada fazer por Manuel Bandeira, Aníbal Machado e Otávio de Faria. Ingressa, por concurso, na carreira diplomática. Em 1944 dirige o Suplemento Literário de O Jornal, onde lança, entre outros, Oscar Niemeyer, Pedro Nava, Marcelo Garcia, francisco de Sá Pires, Carlos Leão e Lúcio Rangel, em colunas assinadas, e publica desenhos de artistas plásticos até então pouco conhecidos, como Carlos Scliar, Athos Bulcão, Alfredo Ceschiatti, Eros (Martim) Gonçalves, Arpad Czenes e Maria Helena Vieira da Silva. Em 1945 colabora em vários jornais e revistas, como articulista e crítico de cinema. Faz amizade com o poeta Pablo Neruda. Sofre um grave desastre de avião na viagem inaugural do hidro Leonel de Marnier, perto da cidade de Rocha, no Uruguai. Em sua companhia estão Aníbal Machado e Moacir Werneck de Castro. Faz crônicas diárias para o jornal Diretrizes. Em 1946 parte para Los Angeles, como vice-cônsul, em seu primeiro posto diplomático. Ali permanece por cinco anos sem voltar ao Brasil. Publica em edição de luxo, ilustrada por Carlos Leão, seu livro, Poemas, sonetos e baladas. Em 1947, em Los angeles, estuda cinema com Orson Welles e Gregg Toland. Lança, com Alex Viany, a revista Film. Em 1949 João Cabral de Melo Neto tira, em sua prensa mensal, em Barcelona, uma edição de cinqüenta exemplares de seu poema Pátria minha. Em 1950 viaja ao México para visitar seu amigo Pablo Neruda, gravemente enfermo. Ali conhece o pintor David Siqueiros e reencontra seu grande amigo, o pintor Di Cavalcanti. Morre seu pai. Também em 1947 retorna ao Brasil. Em 1951casa-se pela segunda vez com Lila Maria Esquerdo e Bôscoli. Começa a colaborar no jornal Última Hora, a convite de Samuel Wainer, como cronista diário e posteriormente crítico de cinema. Em 1952 visita, fotografa e filma, com seus primos, Humberto e José Francheschi, as cidades mineiras que compõe o roteiro do Aleijadinho, com vistas à realização de um filme sobre a vida do escultor que lhe for a encomendado pelo diretor Alberto Cavalcanti. É nomeado delegado junto ao festival de Punta Del Leste, fazendo paralelamente sua cobertura para o Última Hora. Parte logo depois para a Europa, encarregado de estudar a organização dos festivais de cinema de Cannes, Berlim, Locarno e Veneza, no sentido da realização dos Festival de Cinema de São Paulo, dentro das comemorações do IV Centenário da cidade. Em Paris, conhece seu tradutor francês, Jean Georges Rueff, com quem trabalha, em Estrasburgo, na tradução de suas Cinco elegias. Em 1953 nasce sua filha Georgiana. Colabora no tablóide semanário Flan, de Última Hora, sob direção de Joel Silveira. Aparece a edição francesa das Cinq élégies, em edição de Pierre Seghers. Liga-se de amizade com o poeta cubano Nicolás Guillén. Compõe seu primeiro samba, música e letra, "Quando tú passas por mim". Faz crônicas diárias para o jornal A Vanguarda, a convite de Joel Silveira. Parte para Paris como segundo secretário de Embaixada. Em 1954 sai a primeira edição de sua Antologia Poética. A revista Anhembi publica sua peça Orfeu da Conceição, premiada no concurso de teatro do IV Centenário do Estado de São Paulo. Em 1955 compõem em Paris uma série de canções de câmara com o maestro Cláudio Santoro. Começa a trabalhar para o produtor Sasha Gordine, no roteiro do filme Orfeu Negro. No fim do ano vem com ele ao Brasil, por uma curta estada, para conseguir financiamento para a produção da película, o que não consegue, regressando em fins de dezembro a Paris.

Novos Livros e Muitas Andanças

Em 1956 volta ao Brasil em gozo de licença-prêmio. Nasce sua terceira filha, Luciana. Colabora no quinzenário Para Todos a convite de seu amigo Jorge amado, em cujo primeiro número publica o poema "O operário em construção". Paralelamente aos trabalhos da produção do filme Orfeu Negro, tem o ensejo de encenar sua peça Orfeu da Conceição, no Teatro Municipal, que aparece também em edição comemorativa de luxo, ilustrada por Carlos Scliar. Convida Antônio Carlos Jobim para fazer a música do espetáculo, iniciando com ele a parceria que, logo depois, com a inclusão do cantor e violonista João Gilberto, daria início ao movimento de renovação da música popular brasileira que se convencionou chamar de Bossa Nova. Retorna ao posto, em Paris, no fim do ano. Em 1957 é transferido da Embaixada em Paris para a Delegação do Brasil junto à UNESCO. No fim do ano é removido para Montevidéu, regressando, em trânsito, ao Brasil. Publica a primeira edição de seu Livro de Sonetos, em edição de Livros de Portugal. Em 1958 sofre um grave acidente de automóvel. Casa-se com Maria Lúcia Proença. Parte para Montevidéu. Sai o LP Canção do Amor Demais, de músicas suas com Antônio Carlos Jobim, cantadas por Elizete Cardoso. No disco ouve-se, pela primeira vez, a batida da bossa nova, no violão de João Gilberto, que acompanha acantora em algumas faixas, entre as quais o samba "Chega de Saudade", considerado o marco inicial do movimento.

Literatura, Parcerias musicais e Boemia

Em 1959 sai o LP Por Toda Minha Vida, de canções suas com Jobim, pela cantora Lenita Bruno. O filme Orfeu Negro ganha a Palme d'Or do Festival de Cannes e o Oscar, de Hollywood, como melhor filme estrangeiro do ano. Aparece o seu livro Novos poemas II. Casa-se sua filha Susana. Em 1960 retorna à Secretaria do Estado das Relações Exteriores. Em novembro, nasce seu neto, Paulo. Sai a segunda edição de sua Antologia Poética, pela Editora de Autor; a edição popular da peça Orfeu da Conceição, pela livraria São José e Recette de Femme et autres poèmes, tradução de Jean-Georges Rueff, em edição Seghers, na coleção Autour du Monde. Em 1961 começa a compor com Carlos Lira e Pixinguinha. Aparece Orfeu Negro, em tradução italiana de P.A. Jannini, pela Nuova Academia Editrice, de Milão. Em 1962 começa a compor com Baden Powell, dando inicio à série de afro-sambas, entre os quais, Berimbau e Canto de Ossanha. Compõe, com música de Carlos Lyra, as canções de sua comédia-musicada Pobre menina rica. Em agosto, faz seu primeiro show, de larga repercussão, com Antônio Carlos Jobim e João Gilberto,na boate AuBom Gourmet, que daria início aos chamados pocket-shows, e onde foram lançados pela primeira vez grandes sucessos internacionais como Garota de Ipanema e o Samba da bênção. Show com Carlos Lyra, na mesma boate, para apresentar Pobre menina rica e onde é lançada a cantora Nara Leão. Compõe com Ari Barroso as últimas canções do grande compositor popular, entre as quais Rancho das namoradas. Aparece a primeira edição de Para viver um grande amor, pela Editora do Autor, livro de crônicas e poemas. Grava, como cantor, seu disco com a atriz e cantora Odete Lara. Em 1963 começa a compor com Edu Lobo. Casa-se com Nelita Abreu Rocha e parte em posto para Paris, na delegação do Brasil junto a UNESCO. Em 1964 regressa de Paris e colabora com crônicas semanais para a revista Fatos e Fotos, assinando paralelamente crônicas sobre música popular para o Diário Carioca. Começa a compor com Francis Hime. Faz show de grande sucesso com o compositor e cantor Dorival Caymmi, na boate Zum-Zum, onde lança o Quarteto em Cy. Do show é feito um LP. Em 1965 sai Cordélia e o peregrino, em edição do Serviço de Documentação do Ministério da Educação e Cultura. Ganha o primeiro e o segundo lugares do I Festival de Música Popular de São Paulo, da TV Record, em canções de parceria com Edu Lobo e Baden Powell. Parte para Paris e St.Maxime para escrever o roteiro do filme Arrastão, indispondo-se, subseqüentemente, com seu diretor, e retirando suas músicas do filme. De Paris voa para Los Angeles a fim de encontrar-se com seu parceiro Antônio Carlos Jobim. Muda-se de Copacabana para o Jardim Botânico, à rua Diamantina, nº 20. Começa a trabalhar com o diretor Leon Hirszman, do Cinema Novo, no roteiro do filme Garota de Ipanema. Volta ao show com Caymmi, na boate Zum-Zum.

O Poeta Abraça a Música Definitivamente

Em 1966 são feitos documentários sobre o poeta pelas televisões americana, alemã, italiana e francesa, sendo que os dois últimos realizados pelos diretores Gianni Amico e Pierre Kast. Aparece seu livro de crônicas Para uma menina com uma flor pela Editora do Autor. Seu Samba da bênção, de parceria com Baden Powell, é incluída, em versão de compositor e ator Pierre Barouh, no filme Un homme, une femme, vencedor do Festival de Cannes do mesmo ano. Participa do jurí do mesmo festival. Em 1967 aparecem, pela Editora Sabiá, a 6ª edição de sua Antologia poética e a 2ª do seu Livro de sonetos (aumentada). É posto à disposição do governo de Minas Gerais no sentido de estudar a realização anual de um Festival de Arte em Ouro Preto, cidade à qual faz freqüentes viagens. Faz parte do jurí do Festival de Música Jovem, na Bahia. Estréia do filme Garota de Ipanema. Em 1968 falece sua mãe no dia 25 de fevereiro. Aparece a primeira edição de sua Obra poética, pela Companhia José Aguilar Editora. Poemas traduzidos para o italiano por Ungaretti. Em 1969 é exonerado do Itamaraty. Casa-se com Cristina Gurjão.

Parceria de Sucesso com Toquinho

Em 1970 casa-se com a atriz baiana Gesse Gessy. Nasce Maria, sua quarta filha. Início da parceria com Toquinho. Em 1971 muda-se para a Bahia e viaja para a Itália. Em 1972 retorna à Itália com Toquinho onde gravam o LP Per vivere un grande amore. Em 1973 publica A Pablo Neruda. Em 1974 trabalha no roteiro, não concretizado, do filme Polichinelo. Em 1975 excursiona pela Europa. Grava, com Toquinho, dois discos na Itália. Em 1976 escreve as letras de Deus lhe pague, em parceria com Edu Lobo. Casa-se com Marta Rodrigues Santamaria. Em 1977 grava um LP em Paris, com Toquinho e participa do famoso Show com: Tom, Toquinho e Miúcha, no Canecão. Em 1978 excursiona pela Europa com Toquinho. Casa-se com Gilda de Queirós Mattoso, que conhecera em Paris. Em 1979 leitura de poemas no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, a convite do líder sindical Luís Inácio da Silva. Voltando de viagem à Europa, sofre um derrame cerebral no avião. Perdem-se, na ocasião, os originais de Roteiro lírico e sentimental da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Em 1980 é operado a 17 de abril, para a instalação de um dreno cerebral. Morre, na manhã de 9 de julho, de edema pulmonar, em sua casa, na Gávea, em companhia de Toquinho e de sua última mulher. Extraviam-se os originais de seu livro O dever e o haver.

Obras do Autor


Poesias
Forma e Exegese (1935)

Ariana, a Mulher (1936)

Novos Poemas (1938)

Cinco Elegias (1943)

Poemas, Sonetos e Baladas (1946)

Pátria Minha (1949)

Antologia Poética (1955)

Livro de Sonetos (1957)

Novos Poemas II (1959)

Cordélia e o Peregrino (1965)

Para Viver um Grande Amor (1962)

Crônicas
Para uma Menina com uma Flor (1966)

Teatro
Orfeu da Conceição (1962)


Nasce, em meio a forte temporal, na madrugada de 19 de outubro de 1913, no antigo nº 114 (casa já demolida) da rua Lopes Quintas, na Gávea, ao lado da chácara de seu avô materno, Antônio Burlamaqui dos Santos Cruz. São seus pais d. Lydia Cruz de Moraes e Clodoaldo Pereira da Silva Moraes, este, sobrinho do poeta, cronista e folclorista Mello Moraes Filho e neto do historiador Alexandre José de Mello Moraes.
Morre, na manhã de 9 de julho, de edema pulmonar, em sua casa, na Gávea, em companhia de Toquinho e de sua última mulher.

Texto extraído do site: www.vinicius demoraes.com.br e do livro: A Literatura Brasileira Através dos Textos, Massaud Moisés, Editora Cultrix, 1971.

domingo, 7 de junho de 2009

Macunaima (2ª parte)

Esta postagem é continuação de http://literathurando.blogspot.com/2009/06/macunaima-1-parte.html


Capítulo XII – Tequeteque, chupinzão e a injustiça dos homens
Desesperado porque ainda não conseguira reaver a muiraquitã, Macunaíma se disfarça de pianista e tenta, junto ao governo, uma bolsa de estudos na Europa, para onde Venceslau Pietro Pietra havia viajado. Não conseguindo a bolsa, sai a viajar com os manos pelo Brasil pra ver se acha “alguma panela com dinheiro enterrado”. Nestas andanças, encontra um macaco comendo coquinho baguaçu. Como estava com fome, o herói pergunta ao macaco o que estava comendo e ouve a seguinte resposta cínica: “-- Estou quebrando os meus toaliquiçus pra comer.” Macunaíma resolveu imitá-lo, agarrou um “paralelepípedo e juque! nos toaliquiçus. Caiu morto.” Só conseguiu ressuscitar graças à feitiçaria de Maanape, que colocou no lugar do órgão destruído dois cocos-da-baía. Depois “assoprou fumaça de cachimbo no defunto-herói” e este reanimou-se, tomando guaraná e uma dose de pinga.

Capítulo XIII – A piolhenta de Jiguê
Jiguê resolveu se amulherar com Suzi, cunhatã muito velhaca que passava todo o tempo namorando Macunaíma. Jiguê descobre, fica furioso, dá uma baita surra no herói e expulsa Suzi com uma porretada. Levada por seus piolhos, Suzi vai “pro céu virada na estrela que pula”.

Capítulo XIV - Muiraquitã
Maanape comunica ao herói a volta de Venceslau Pietro Pietra. Macunaíma enche-se de coragem e decide matar o gigante. Come cobra e, com muita esperteza, coloca Piaimã balançando num cipó de japecanga, embala-o com força e o gigante acaba caindo dentro de um buraco onde Ceiuci, a velha caapora, preparava uma imensa macarronada. O gigante cai na água fervente e o cheiro de seu couro cozido, além de matar todos os tico-ticos da cidade, provoca o desmaio de Macunaíma. Quando se recupera, o herói apanha a muiraquitã e volta pra pensão.

Capítulo XV – A pacuera de Oibê
Morto Piaimã e reconquistada sua muiraquitã, Macunaíma, Maanape e Jiguê são novamente índios e resolvem voltar para o distante Uraricoera. O herói levava no peito “uma satisfação imensa”, mas não deixa de ter saudade de São Paulo. Tanto que levava consigo todas as coisas que mais o haviam entusiasmado na “civilização paulista”: um casal de legornes, um revólver Smith-Wesson e um relógio Patek. Um bando de aves forma uma grande tenda de asas coloridas que protegem o Imperador do Mato-Virgem. Nesta viagem de volta feliz, o herói teve novas aventuras amorosas, lembrando-se com saudade da vida dissoluta que levara em São Paulo: encontra-se com Iriqui (antiga companheira de Jiguê) e com uma linda princesa que tinha sido transformada num pé de carambola. Com sua muiraquitã, o herói faz uma mandinga e o caramboleiro vira “uma princesa muito chique”, com quem tem vontade de brincar, mas não pode, pois são perseguidos pelo Minhocão Oibê. Graças a uma nova mandinga, o herói transforma Oibê num cachorro-do-mato, de rabo cabeludo e goela escancarada. Como Macunaíma agora só queria brincar com a princesa, Iriqui fica tristíssima e sobe “pro céu, chorando luz, virada numa estrela”.

Capítulo XVI - Uraricoera
Finalmente, chega ao Uraricoera natal e, ao passar por um lugar chamado Pai da Tocandeira, reconhece suas raízes e chora: a maloca da tribo era agora uma tapera arruinada. Uma sombra leprosa devora seus irmãos e a princesa, e o herói fica “defunto sem choro, no abandono completo”, empaludado e sem forças para construir uma oca. Ata sua rede em dois cajueiros no alto da barranca junto do rio e assim passa seus dias “caceteado e comendo cajus”. Todas as aves também o abandonam, ficando somente um papagaio pra quem o herói conta todos os casos que lhe tinham acontecido. Graças a este papagaio é que se salvou do esquecimento a história do herói, parido por uma índia tapanhumas.

Capítulo XVII – Ursa maior
Num dia de janeiro de muito calor, o herói acorda sentindo umas “cosquinhas”, que até lhe parecem feitas “por mãos de moça”. Era a última vingança de Vei, a Sol, tramando para liquidá-lo de vez. Macunaíma lembra-se de que há muito não brincava e vai tomar banho num lagoão, pensando que a água fria viria amortecer seus desejos de amor. O herói, encaminhando-se para a água, enxerga lá no fundo “uma cunhã lindíssima”, ora branca de cabelos louros, ora morena de cabelos negros, que começa a tentá-lo com danças e meneios. Macunaíma hesita, temeroso, mas acaba mergulhando na lagoa, desvairado pelos encantos irresistíveis da uiara. Estão mutila, devorando-lhe uma perna, os brincos, os cocos-da-baía, as orelhas, os dedões, o nariz e os beiços. Desaparece também com sua muiraquitã: o herói pula e dá “um grito que encurtou o tamanho do dia”. Tem ainda força para lançar plantas venenosas no lagoão, matando peixes, piranhas e botos que lá estavam.

No afã de recuperar seus tesouros, Macunaíma abre-lhe as barrigas e o que encontra reprega no corpo mutilado, com sapé e cola de peixe. Não consegue, todavia, reconquistar a perna nem a muiraquitã, “engolidas pelo monstro Ururau”. E assim tudo se acaba. Macunaíma, mutilado, vai bater na casa do Pai Mutum, que, com dó dele, faz uma feitiçaria e transforma-o na constelação da Ursa Maior. “Ia pro céu viver com a malvada. Ia ser o brilho bonito mas inútil porém de mais uma constelação.” Neste balanço que Macunaíma faz de sua existência, ele dialoga com sua consciência e deixa sua mensagem para a posteridade: “Não vim no mundo para ser pedra”. A pedra simboliza disciplina rígida, método, lapidação de caráter, traços que Macunaíma, a própria encarnação da esperteza e da improvisação, nunca quis assumir.
A Semana de Arte Moderna (1922)
A semana na realidade durou três dias. Mas nunca três dias abalaram tanto o mundo da arte brasileira. Nos dia 13, 15 e 17 de fevereiro de 1922, sob o apadrinhamento do romancista pré-modernista Graça Aranha, os jovens paulistanos empenhados em revolucionar a arte apresentaram, pela primeira vez em conjunto, suas idéias de vanguarda.
A Semana, realizada no Teatro Municipal de São Paulo, foi aberta com a conferência A emoção estética na arte, de Graça Aranha, em que atacava o conservadorismo e o academicismo da arte brasileira.

Seguiram-se leituras de poemas de, entre outros, Oswald de Andrade e Manuel Bandeira, que não pôde comparecer e cujo poema Os Sapos foi lido por Ronald de Carvalho sob um coro de coaxos e apupos.
Mário de Andrade leu seu ensaio “A escrava que não é Isaura” nas escadarias do teatro. Obras de Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Victor Brecheret e outros artistas plásticos e arquitetos foram expostas. Por fim, apresentaram-se a pianista Guiomar Novaes e o maestro e compositor Heitor Vila-Lobo, que não foi poupado das vaias. Como se vê, a recepção da Semana não foi tranqüila. As ousadias modernistas inquietavam e irritavam o público.
Desfecho
“Acabou-se a história e morreu a vitória”. Os filhos da tribo dos Tapanhumas “se acabaram de um em um”. “Uma feita um homem foi lá” e, rompendo o “silêncio enorme” que “dormia à beira-rio do Uraricoera”, ouve-se:
-- “Curr-pac, papac! curr-pac, papac!…”
Era o papagaio ao qual Macunaíma havia contado toda a sua história. “Então o pássaro principiou falando numa fala mansa, muito nova, muito!”
“Tudo ele contou pro homem e depois abriu asa rumo de Lisboa. E o homem sou eu, minha gente, e eu fiquei pra vos contar a história. Por isso que vim aqui. Me acocorei em riba destas folhas, catei meus carrapatos, ponteei na violinha e em toques rasgado botei a boca no mundo cantando na fala impura as frases e os casos de Macunaíma, herói da nossa gente”. Era o próprio Mário de Andrade. “Tem mais não”.

As fontes

Mário de Andrade nunca escondeu que tomou como fonte principal para a redação de Macunaíma a obra Von Roroima zum Orinoco (Do Roraima ao Orenoco) de Theodor Koch-Grünberg, publicada, em cinco volumes, entre 1916 e 1924. Graças ao monumental trabalho de Manuel Cavalcanti Proença, Roteiro de Macunaíma, podemos acompanhar como o escritor paulista foi reelaborando as narrativas colhidas na obra do alemão, mesclando-a a outras fontes, como livros de Capistrano de Abreu, Couto Magalhães, Pereira da Costa ou mesmo relatos orais, como o que o grande compositor Pixinguinha lhe fez de uma cerimônia de macumba, para ir tecendo sua rapsódia.

Nas lendas de heróis taulipang e arecuná, apresentadas por Koch-Grünberg, Mário de Andrade encontrou o herói Macunaíma, que, segundo o estudioso alemão, “ainda era menino, porém mais safado que todos os outros irmãos.”
Nas palavras do poeta-crítico Haroldo de Campos:
“O próprio Koch-Grünberg, em sua “Introdução” ao volume, ressalta a ambigüidade do herói, dotado de poderes de criação e transformação, nutridor por excelência, ao mesmo tempo, todavia, malicioso e pérfido. Segundo o etnógrafo alemão, o nome do supremo herói tribal parece conter como parte essencial a palavra MAKU, que significa “mau” e o sufixo IMA, “grande”. Assim, Macunaíma significaria “O Grande Mau”, nome – observa Grünberg – “que calha perfeitamente com o caráter intrigante e funesto do herói”. Por outro lado, os poderes criativos de Macunaíma levaram os missionários ingleses em suas traduções da Bíblia para a língua indígena a denominar o Deus cristão pelo nome do contraditório herói tribal, decisão que Koch-Grünberg comenta criticamente”.

O herói sem nenhum caráter
Foi, portanto, na obra do etnólogo alemão que Mário de Andrade, paradoxal e muito antropofagicamente, encontrou a essência do brasileiro. O próprio autor de Macunaíma, em prefácio que nunca chegou a publicar com o livro, nos conta como ocorreu à descoberta:
. E Macunaíma é um herói surpreendentemente sem caráter. (Gozei)”
As metamorfoses pelas quais passa a personagem, de sabor surrealista, podem muito bem ser associadas à sua “falta de caráter”, assim como o fascínio que revela pela “língua de Camões”, na Icamiabas. Carta pra
Foco Narrativo
Embora predomine o foco da 3a pessoa, Mário de Andrade inova utilizando a técnica cinematográfica de cortes bruscos no discurso do narrador, interrompendo-o para dar vez à fala dos personagens, principalmente Macunaíma. Esta técnica imprime velocidade, simultaneidade e continuidade à narrativa. Exemplo:
“Lá chegado ajuntou os vizinhos, criados a patroa cunhãs datilógrafos estudantes empregados-públicos, muitos empregados-públicos! Todos esses vizinhos e contou pra eles que tinha ido caçar na feira do Arouche e matara dois…
-- …mateiros, não eram viados mateiros, não, dois viados catingueiros que comi com os manos. Até vinha trazendo um naco pra vocês mas porém escorreguei na esquina, caí derrubei o embrulho e o cachorro comeu tudo.”
(Cap. XI – A Velha Ceiuci)
Espaço e tempo
As estripulias sucessivas de Macunaíma são vividas num espaço mágico, próprio da atmosfera fantástica e maravilhosa em que se desenvolve a narrativa. Em seu Roteiro de Macunaíma, mestre Cavalcanti Proença afirma que Macunaíma se aproxima da epopéia medieval, pois “tem de comum com aqueles heróis a sobre-humanidade e o maravilhoso. Está fora do espaço e do tempo. Por esse motivo pode realizar aquelas fugas espetaculares e assombrosas em que, da capital de São Paulo foge para a Ponta do Calabouço, no Rio, e logo já está em Guarajá-Mirim, nas fronteiras de Mato Grosso e Amazonas para, em seguida, chupar manga-jasmim em Itamaracá de Pernambuco, tomar leite de vaca zebu em Barbacena, Minas Gerais, decifrar litóglifos na Serra do Espírito Santo e finalmente se esconder no oco de um formigueiro, na Ilha do Bananal, em Goiás”.

Macunaíma é um personagem outsider, enquanto marginal, anti-herói, fora-da-lei, na medida em que se contrapõe a uma sociedade moderna, organizada em um sistema racional, frio e tecnológico. Assim, o tempo é totalmente subvertido na narrativa. O herói do presente entra em contato com figuras do passado, estabelecendo-se um curioso “diálogo com os mortos”: Macunaíma fala com João Ramalho (séc. XVI), com os holandeses (séc. XVII), com Hércules Florence (séc. XIX) e com Delmiro Gouveia (pioneiro da usina hidrelétrica de Paulo Afonso e industrial nordestino que criou a primeira fábrica nacional de linhas de costura).

Postado originalmente em: http://www.brasilescola.com/literatura/macunaima2.htm

Macunaima (1ª parte)

Macunaíma e a renovação da linguagem literária. Publicado em 1928, numa tiragem de apenas oitocentos exemplares (Mário de Andrade não conseguira editor), Macunaíma, o herói sem nenhum caráter, é uma das obras pilares da cultura brasileira.
Numa narrativa fantástica e picaresca, ou, melhor dizendo, “malandra”, herdeira direta das Memórias de um Sargento de Milícias (1852) de Manuel Antônio de Almeida, Mário de Andrade reelabora literariamente temas de mitologia indígena e visões folclóricas da Amazônia e do resto do país, fundando uma nova linguagem literária, saborosamente brasileira.

Macunaíma - bem como Memórias Sentimentais de João Miramar (1924) e Serafim Ponte Grande (1933), de Oswald de Andrade - foram obras revolucionárias na medida em que desafiaram o sistema cultural vigente, propondo, através de uma nova organização da linguagem literária, o lançamento de outras informações culturais, diferentes em tudo das posições mantidas por uma sociedade dominada até então pelo reacionarismo e o atraso cultural generalizado.
Nacionalista crítico, sem xenofobia, Macunaíma é a obra que melhor concretiza as propostas do movimento da Antropofagia (1928), criado por Oswald de Andrade, que buscava uma relação de igualdade real da cultura brasileira com as demais. Não a rejeição pura e simples do que vem de fora, mas consumir aquilo que há de bom na arte estrangeira. Não evitá-la, mas, como um antropófago, comer o que mereça ser comido.
O tom bem humorado e a inventividade narrativa e lingüística fazem de Macunaíma uma das obras modernistas brasileiras mais afinadas com a literatura de vanguarda no mundo, na sua época. Nesse romance encontram-se dadaísmo, futurismo, expressionismo e surrealismo aplicados a um vasto conhecimento das raízes da cultura brasileira

BIOGRAFIA

Vida de Mário de Andrade
Universidade do Distrito Federal. Não se adapta à mudança, vive deprimido e, “numa noite de porre imenso” bate com o punho na mesa do
bar e fala para si mesmo: “Vou-me embora para São Paulo, morarna minha casa”.Volta para São Paulo em 1940, trabalha no Serviço de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, que ajudara a criar em 36, e viaja por todo o Estado de São Paulo, fazendo pesquisas.
Em 1942, publica O Movimento Modernista, famosa conferência, em que faz o balanço e a crítica de sua geração, “assinalando os erros do Modernismo, principalmente o que considera como “abstencionismo” diante dos graves problemas sociais do seu tempo”.

Sua saúde, já frágil, piora a partir dessa época. Em 43, inicia a publicação das suas Obras Completas, planejada para sair em dezoito volumes.
Em 25 de fevereiro de 1945, aos 51 anos de idade, Mário de Andrade sofre um ataque cardíaco fulminante e morre, deixando inacabado o livro Contos Novos (1946) em que se destacam narrativas de inspiração freudiana, como “Vestida de Preto” e “Frederico Paciência”, e contos de preocupação social, como “O Poço” e “Primeiro de Maio”.
Como crítico literário seu legado é imenso. Em A escrava que não é Isaura (1925), por exemplo, reúne ensaios provocativos contra o passadismo. Já nos Aspectos da Literatura Brasileira (1943), aborda, de maneira bem menos passional, os mais importantes escritores da literatura brasileira.
Com sua morte precoce o Brasil ficou órfão de um dos seus mais fecundos, múltiplos e íntegros intelectuais que, certa feita, definiu-se como “trezentos, sou trezentos-e-cincoenta”. Números muito modestos, levando-se em conta sua importância para a cultura brasileira do século XX.

ESTILO

Mário de Andrade e o Modernismo
Foram a Semana de 22 e seus desdobramentos que projetaram Mário de Andrade como figura decisiva do movimento modernista. No processo de implantação da nova mentalidade cultural, Mário destacou-se como teorizador e ativista cultural. Com a determinação própria dos líderes que pretendem injetar uma nova consciência, multiplicou-se em músico, pesquisador de etnografia e folclore, poeta, contista, romancista, crítico de todas as artes, correspondente cultural que troca cartas com artistas novos consagrados, além de ter ocupado vários cargos na burocracia estatal, relacionados com o desenvolvimento da cultura em suas várias
manifestações.
Era um sujeito muito sério, católico fervoroso, dotado de uma capacidade extraordinária de estudo e ação. Com carisma e afeto, conseguiu colocar a renovação modernista no trilho de um presente e de um futuro culturais marcados por um nacionalismo arejado e lúcido.

ESTILO LITERÁRIO
Mário de Andrade nos conta que escreveu Macunaíma em seis dias, deitado, bem à maneira de seu herói, em uma rede na “Chácara de Sapucaia”, em Araraquara, SP. Diz ainda: “Gastei muito pouca invenção neste poema fácil de escrever (…). Este livro afinal não passa duma antologia do folclore brasileiro.” A obra, composta em apenas seis dias, é fruto de anos de pesquisa das lendas e mitos indígenas e folclóricos que o autor reúne utilizando a linguagem popular e oral de várias regiões do Brasil. Trata-se, por isso mesmo, de uma rapsódia. Assim os gregos designavam obras como a Ilíada ou a Odisséia de Homero, que reúnem séculos de narrativas poéticas orais, resumindo as tradições folclóricas de todo um povo. Para o musicólogo Mário de Andrade, o termo certamente remete às fantasias instrumentais que utilizam temas e processos de composição improvisada, tirados de cantos tradicionais ou populares, como as rapsódias húngaras de Liszt.
É importante notar que, além de relatar inúmeros mitos recolhidos e diversas fontes populares, Mário de Andrade também inventa, de maneira irônica, vários mitos da modernidade. Apresenta, entre outros, os mitos da criação do futebol, do truco, do gesto da “banana” ou do termo “Vá tomar banho!” Há, em Macunaíma, portanto, além da imensa pesquisa, muita invenção.

CONTEXTO HISTÓRICO

O Brasil na década de 20
A sociedade brasileira, no tempo em que surgiu Macunaíma, parecia bastante mudada. Já não tinha aquele ar de fazenda que respiramos durante 4 séculos. Havia muitas fábricas (principalmente em São Paulo), grandes aglomerados urbanos, com populações de quase 1 milhão de habitantes. O
comércio e a indústria prosperavam rapidamente, graças ao mercado consumidor formado pelos moradores das cidades e pelos colonos de
origem estrangeira. As mulheres fumavam, iam sozinhas ao cinema,exibiam as pernas.
Algo impressionava bastante os brasileiros daquele tempo: a velocidade dos meios de comunicação e transporte! Eram carros, bondes, trens, telégrafos, rádios, telefone… Empresas, bancos, bolsas de valores…
Desde 1922, o país parecia estar em ebulição: além da Semana de Arte Moderna, foi criado o Partido Comunista e iniciado o movimento tenentista, que, durante toda a década de 20, desafiou o governo federal.

O clímax deste movimento foi a Coluna Prestes que percorreu 33 mil quilômetros do interior do Brasil, travando mais de 100 combates, em dois anos e meio (1924-1927). Arthur Bernardes e Washington Luís usaram todos os meios para combatê-la, lançando até o cangaceiro Lampião no seu encalço. A Coluna, porém, não teve força para derrubar o governo central, nem conseguiu rebelar o povo contra o regime. Esgotada, embora invicta, internou-se na Bolívia. No entanto, a imagem de Luís Carlos Prestes, com seus prodígios de técnica militar e de bravura pessoal, constituiu um mito que exerceu sobre os intelectuais de esquerda (entre os quais se incluíam Mário de Andrade, Murilo Mendes e Carlos Drummond de Andrade) uma grande fascinação. O tenentismo (com seus levantes ao longo da década) aliado à crise desencadeada pelo estouro da Bolsa de Nova Iorque em 1929, são fatos que se somam para derrubar a República Velha na triunfante Revolução de outubro de 1930.
(Cap. XI – A Velha Ceiuci).

TEXTO

A síntese do romance – rapsódia
Capítulo I - Macunaíma
Macunaíma, “herói de nossa gente” nasceu à margem do Uraricoera, em plena floresta amazônica. Descendia da tribo dos Tapanhumas e, desde a primeira infância, revelava-se como um sujeito “preguiçoso”. Ainda menino, busca prazeres amorosos com Sofará, mulher de seu irmão Jiguê, que só lhe havia dado pra comer as tripas de uma anta, caçada por Macunaíma numa armadilha esperta. Nas várias transas (“brincadeiras”) com Sofará, Macunaíma transforma-se num príncipe lindo, iniciando um processo constante de metamorfoses que irão ocorrer ao longo da narrativa: índio negro, vira branco, inseto, peixe e até mesmo um pato, dependendo das circunstâncias.
Capítulo II - Maioridade
De tanto aprontar, foi abandonado pela mãe no meio do mato. Tremelicando, com as perninhas em arco, Macunaíma botou o pé na estrada até que topou com o Curupira e perguntou-lhe como faria para voltar pra casa. Maliciosamente, o Curupira ensina-lhe um caminho errado que Macunaíma, por preguiça, não seguiu. Escapando do monstro, o herói topou com uma voz que cantava uma toada lenta: era a cotia, que depois de ouvir o piá contar como enganara o Curupira, jogou-lhe em cima calda envenenada de mandioca. Isto fez Macunaíma crescer, atingindo o “tamanho dum homem taludo”.

Capítulo III – Ci, Mãe do Mato
Encontra Ci, a Mãe do Mato e inventa com ela lindas e novas maneiras de gozos de amor. O resultado desse idílio é o nascimento de um curumi, que morreu prematuramente depois de mamar no único peito de Ci, envenenado pela Cobra Preta. Enterrado o filho, Ci também resolveu deixar este mundo. Deu ao herói sua muiraquitã famosa e subiu pro céu por um cipó, transformando-se numa estrela.

Capitulo IV – Boiúna Luna
Tomado de tristeza, Macunaíma despediu-se das Icamiabas e partiu rumo às matas misteriosas. No caminho, encontra Capei, monstro fantástico que abre a goela e solta uma nuvem de marimbondos. Nas lutas contra o monstro, Macunaíma perde seu talismã e fica sabendo, através de um uirapuru, que a tartaruga que engolira sua pedra tinha sido apanhada por um mariscador. Este vendera a muiraquitã a um rico fazendeiro chamado Venceslau Pietro Pietra, proprietário de uma mansão na rua Maranhão, em São Paulo. Macunaíma resolve, então, vir para a capital paulista recuperar sua muiraquitã.

Capítulo V - Piaimã
O herói junta seus irmãos e desce o Araguaia, com sua esquadra de igarités cheias de cacau. Em São Paulo, fica sabendo que Venceslau Pietro Pietra
era o gigante Piaimã, comedor de gente, companheiro de uma caapora velha chamada Ceiuci, também antropófaga e muito gulosa. Esse capítulo apresenta uma das passagens mais saborosas do romance: a chegada de Macunaíma e seus irmãos à cidade de São Paulo. Nesse momento, Mário de Andrade inverte os relatos quinhentistas da Literatura Informativa. Aqui é o índio que se depara com a dita “civilização” e procura assimilá-la, digerindo-a com suas próprias enzimas culturais

Capítulo VI – A francesa e o gigante
Depois de uma tentativa de aproximação frustrada, Macunaíma resolve se vestir de francesa para conquistar Venceslau Pietro Pietra e reconquistar sua muiraquitã. O regatão não emprestou a pedra nem quis vendê-la. Mas deixou claro que poderia dá-la se a francesa resolvesse “brincar” com ele… Muito inquieto, Macunaíma foge, percorrendo, em louca correria, grande parte do território brasileiro

Capítulo VII - Macumba
Como não tivesse força suficiente pra matar o gigante, Macunaíma vem para o Rio de Janeiro procurar o terreiro de macumba da tia Ciata. Pediu à macumbeira vários castigos pro gigante Piaimã que, além de receber a chifrada de um touro selvagem, é ferroado por quarenta mil formigas-de-fogo.

Capítulo VIII – Vei, a Sol
É também no Rio de Janeiro que Macunaíma reencontra a Vei, a deusa-sol que pretendia casar uma de suas três filhas com o herói. Embora tivesse prometido, Macunaíma não cumpriu a palavra empenhada: logo que anoiteceu, convidou uma portuguesa e brincou com ela na jangada. Depois foram descansar num banco da avenida Beira-mar, no Flamengo, quando surgiu Mianiquê-Teibê, monstro de garras enormes com olhos no lugar dos peitos e duas bocarras nos pés, de dentes aguçados. Macunaíma saiu correndo pela praia; o monstro comeu a portuga e desapareceu.

Capítulo IX – Carta pras Icamiabas
O herói retorna a São Paulo e, saudoso, resolve escrever uma “carta pras icamiabas”, relatando como era sua vida em São Paulo. Faz, num satírico estilo beletrista, uma descrição da agitada vida paulistana, com seus arranha-céus, ruas “habilmente estreitas” cheias de gente, cinemas, casas de moda, ônibus, estátuas e jardim. Nesta pernóstica missiva, o corrupto Imperador faz questão de detalhar para as amazonas a prática constante de amores pecaminosos, tanto que ele até pensa em tirar proveito da exploração do lenocínio. Critica o capitalismo selvagem dos paulistas locomotivas e dos italianos arrivistas, destacando, horrorizado, ao final, uma curiosidade original deste povo: “falam numa língua e escrevem noutra”. Depois de abençoar as suas súditas, termina a carta, com a maior desfaçatez, pedindo mais uma “gaita” pras suas fiéis icamiabas

Capítulo X – Pauí-pódole
A surra que Venceslau Pietro Pietra recebeu de Exu foi tão violenta que ele ficou meses numa rede, travado pelos suplícios a que foi submetido. Sem poder readquirir a muiraquitã, Macunaíma ocupou-se então do complicado estudo das duas línguas da terra, “o brasileiro falado e o português escrito”. Interrompe um mulato pedante que fazia um verborrágico discurso sobre o Cruzeiro do Sul, falando que aquelas quatro estrelas que brilham no vasto campo do céu são, na verdade, o Pai do Mutum, figura zoocosmológica que teve seu corpo de ave metamorfoseado numa constelação. Capítulo

XI – A velha Ceiuci
Depois de ter passado a noite brincando com a patroa da pensão, Macunaíma falou pros seus irmãos Maanape e Jiguê que tinha achado “rasto fresco de tapir”, em pleno asfalto paulistano, junto à Bolsa de Mercadorias. Induziu seus irmãos a caçarem o animal e estes quase acabam sendo linchados pela multidão que se aglomerou pra assistir à caçada. Um estudante subiu na capota de um automóvel e discursou contra Maanape e Jiguê. Foi interrompido por Macunaíma que, tomado por um efêmero acesso de fraternidade, resolveu defender os irmãos entrando no meio da multidão e distribuindo rasteiras e cabeçadas até ser preso por um “grilo”, soldado da antiga guarda-civil de São Paulo.

No meio da confusão, o herói conseguiu fugir e foi ver como passava o gigante Venceslau Pietro Pietra, ainda “convalescendo da sova apanhada na macumba”. Faz uma aposta com o curumi Chuvisco pra ver quem conseguia assustar o gigante e sua família. Perde a aposta e resolve fazer uma pescaria. Como não tivesse anzol, o herói se transforma numa “piranha feroz” pra cortar a linha de um inglês que pescava a seu lado. Acontece que a velha feiticeira Ceiuci, mulher do gigante, também costumava pescar no igarapé Tietê e prende o herói. Ao ser pescado pela tarrafa da feiticeira, Macunaíma vira um pato que devia ser logo comido. Além de brincar com a filha mais moça de Ceiuci, ludibria-a e foge, montado “num cavalo castanho-pedrez que pra carreira Deus o fez”. É uma fuga espetacularmente surrealista: num momento está em Manaus e noutro em Mendoza, na Argentina.

Postado originalmente em:http://www.brasilescola.com/literatura/macunaima.htm
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